As escolhas, de uma forma ou de outra, sempre pautam a vida do homem. Nosso destino está subordinado ao que fazemos do agora, condição essencial para compreender — e aceitar — o porvir. Mas e quando o destino coloca-nos contra a parede e despeja sobre nós toda sorte de provações, quase todas tão absurdas em suas exigências que terminamos apenas por baixar a cabeça e aceitar seus desmandos? O destino nos prepara surpresas, e muitas dessas surpresas se traduzem por fracassos retumbantes, que por seu turno escondem grandes oportunidades quanto a descobrir novos caminhos para se alcançar resultados com que se sonha há muito — desde que não se tenha medo de briga. Todos nos deparamos com obstáculos aparentemente invencíveis ao longo da vida, mas escalar essas muralhas não é para qualquer um. “O Urso do Pó Branco” é uma dessas histórias que nos exigem uma boa dose de condescendência e, por que não?, de coragem. Em 1985, uma grande carga de cocaína caiu na Floresta de Chattahoochee, na Geórgia, e a partir de um acontecimento meio trivial Elizabeth Banks tece uma sátira acerca do absurdo a permear a vida do homem, tudo regado a muita violência.
O gênero humano está sempre precisando de quem o salve, eis a sua desgraça — e a sua redenção. Lutando contra suas tantas fraquezas, o homem se depara com a evidência de que compreender o outro, emanar uma palavra de incentivo, um sorriso franco, desarmado, sem sobrossos, sem receio de ser tachado de doido, dirigir ao próximo um olhar de bondade, de empatia que seja, muitas vezes exige-lhe tamanho sacrifício que é como se fizéssemos mesmo uma longa viagem para aquela vida, na qual as circunstâncias que consideramos as mais absurdas são o que pode haver de mais corriqueiro. Nossa dificuldade em lidar com o inesperado é o mote central do roteiro de Jimmy Warden, que oscila entre relatos jornalísticos, a campanha antidrogas encampada pela primeira-dama Nancy Reagan (1921-2016) e o delírio mais fantasioso para dizer o que pretende.
Sim, choveu cocaína em Chattahoochee quarenta anos atrás, porém não consta que o animal, jocosamente apelidado de Pablo Escobear, trocadilho que junta o nome do barão colombiano do tráfico e a palavra “bear”, urso em inglês, tenha matado alguém enquanto esteve sob efeito da substância — não se sabe nem se o urso chegou a ter mesmo um barato. Feita esta ponderação, Banks arrasta quase todo o elenco numa poça de sangue, tendo como pano de fundo a insana busca de Sydney Dentwood, o traficante interpretado por Ray Liotta (1954-2022), pelas bolsas em que foram acondicionados os tabletes de cocaína. “O Urso do Pó Branco” poderia ser uma crônica sobre a dependência econômica da América naquele pozinho mágico, mas o filme é nonsense demais para tal finalidade. É melhor aproveitar a viagem sem maiores elaborações intelectuais.
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