Agnes Svan atravessa um terreno incandescente. Essa é a sensação que sua trajetória transmite em “Uma Parte de Você”, drama juvenil dirigido pelo sueco Sigge Eklund. Aos dezessete anos, ela poderia construir sua própria felicidade, ainda que dentro de suas próprias regras. Contudo, prefere viver na sombra de Julia, a irmã mais velha, cuja presença dominante lhe serve de guia e de obstáculo. O enredo não surpreende por sua novidade, mas pelo modo como o cineasta articula os contrastes entre a amargura e o encanto dos anos formativos. Esses elementos, que poderiam beirar o irreal, ganham contornos inegavelmente autênticos, compondo uma melodia que ressoa em qualquer um que já enfrentou os dilemas da juventude.
A roteirista Michaela Hamilton desenha Agnes como uma jovem escravizada por expectativas externas, ajustando-se com precisão cirúrgica aos padrões estabelecidos por um consenso invisível. No desenrolar da trama, torna-se evidente sua tentativa incessante de apagar incêndios internos, um esforço que a conduz, por caminhos tortuosos, ao amadurecimento e à aceitação de si mesma.
Julia, por sua vez, é o reflexo distorcido no qual Agnes insiste em se mirar. A irmã mais velha parece ter tudo: carisma, confiança, um círculo social consolidado. Já Agnes enxerga em si apenas falhas, sem perceber que essas inseguranças são partilhadas por tantos outros. Como em qualquer rito de passagem, ela se vê cercada por desafios impostos por aqueles que, sob uma aparência dócil, carregam intenções vorazes. A estrutura do filme permite que Eklund explore essas camadas com precisão e cautela, sem apelar para obviedades.
O primeiro ato introduz Felicia Maxime e Zara Larsson como amigas que, apesar de diferenças evidentes, compartilham uma ligação sincera, imune a perturbações externas. Mas a inquietude de Agnes a impede de conter sua obsessão por Noel, interpretado sem grande brilho por Edvin Ryding. A tragédia que os une não se ancora em explicações definitivas, mas em nuances que revelam a protagonista de forma sutil. Sua inclinação pelo teatro, sua devoção à escritora Selma Lagerlöf (1858-1940), primeira mulher laureada com o Nobel de Literatura, e sua nostalgia musical por hinos pop como “Wake Me Up” (2013), de Avicii (1989-2018), desenham um retrato vívido de sua confusão interna. E, afinal, quem poderia julgá-la por isso?
★★★★★★★★★★