Jason Momoa e Aquaman se tornaram praticamente sinônimos, e essa simbiose é um dos trunfos da sequência dirigida por James Wan. Sem a pretensão de engrandecer artificialmente a própria obra, Wan conduz “Aquaman 2: O Reino Perdido” com uma fluidez que torna cada cena uma peça orgânica no conjunto. O filme não precisa justificar sua existência nem convencer o espectador a embarcar na jornada; simplesmente entrega o que se espera de uma aventura desse porte: ação em abundância, humor involuntário e um toque de fantasia que suaviza até os corações mais resistentes.
A produção evoca a energia de um desenho animado para adultos — e para quem ainda cultiva certa infantilidade cinematográfica — ao apresentar um herói que cavalga hipocampos relinchantes e enfrenta tubarões com rugidos de leão, tudo em meio a um roteiro que dosa despretensão e ousadia, assinado por Wan, David Leslie Johnson-McGoldrick e pelo próprio Momoa.
Seja qual for o arquétipo, heróis de qualquer estirpe compartilham um denominador comum: a tentativa de apaziguar cicatrizes do passado. Desde os mais luminosos até os que transitam pelas sombras, todos carregam traumas que os empurram para missões cada vez mais audaciosas, por vezes beirando o martírio. Não se trata apenas da salvação do mundo, mas de um ajuste de contas pessoal, um conflito interno que reflete no macrocosmo da narrativa.
Caso a ficção permitisse aos super-heróis abusarem irrestritamente de seus poderes em nome da ordem, a história do cinema — e, por extensão, da cultura pop — seria irremediavelmente distinta. Basta recordar qualquer lembrança da infância para compreender que esses seres híbridos, mesclando traços humanos com atributos de morcegos, aracnídeos ou criaturas marinhas, passam boa parte de suas trajetórias fugindo de dilemas que, muitas vezes, nem eles conseguem decifrar. É nesse contexto que “Aquaman 2: O Reino Perdido” se insere com propriedade.
Arthur Curry agora carrega o peso da paternidade, embora mantenha sua cabeleira de surfista e um apreço etílico acima do recomendável. Mas os verdadeiros desafios não vêm apenas do mar, e sim dos fantasmas que o assombram, personificados pelo meio-irmão Orm Marius, o Mestre do Oceano, e pelo vingativo Black Manta, também chamado David Kane. A interação entre Patrick Wilson e Yahya Abdul-Mateen II injeta personalidade em um universo que bebe na fonte de Júlio Verne, H.P. Lovecraft e H.G. Wells, tudo embalado por uma estética que remete ao stop motion de Ray Harryhausen. É essa combinação que mantém o fascínio vivo, garantindo que o mergulho nessa odisseia submarina valha a pena.
★★★★★★★★★★