Kate Winslet assume o papel de Mare Sheehan, uma detetive de uma pequena cidade da Pensilvânia, cuja vida pessoal é tão fragmentada quanto os casos que investiga. Com uma postura reservada e distante, ela carrega cicatrizes emocionais evidentes: um divórcio ainda recente, a dor da perda e a responsabilidade de criar o neto.
Enquanto seu ex-marido recomeça ao lado de outra mulher, Mare se afunda no trabalho, tentando equilibrar seus traumas com a pressão de uma comunidade que cobra respostas para crimes não resolvidos. Seu comportamento endurecido e sua falta de preocupação com aparências reforçam um arquétipo muitas vezes reservado a personagens masculinos no gênero policial, tornando-a uma protagonista singular.
O enredo se desenrola a partir da investigação do desaparecimento de Katie Bailey, jovem que sumiu há um ano sem deixar rastros. A polícia local falha em trazer respostas, o que gera revolta na mãe da vítima e expõe a fragilidade do departamento. Diante da ineficiência das buscas, um novo investigador é enviado: Colin Zabel (Evan Peters), jovem detetive que recentemente teve sucesso em um caso de grande repercussão. A chegada de Zabel não apenas desafia Mare, como também altera a dinâmica da investigação.
Quando um novo crime ocorre, o cenário se torna ainda mais sombrio. Erin, uma adolescente com laços próximos à comunidade, é assassinada, e a suspeita de que seu caso esteja conectado ao desaparecimento de Katie leva a investigação por caminhos inesperados. Seria o responsável alguém de seu círculo íntimo?
Um ex-namorado, colegas que a atormentavam, ou uma figura ainda não identificada? O mistério se aprofunda quando outra jovem, Missy, desaparece, alimentando a suspeita de um possível serial killer. Mas, ao contrário de Erin, cujos restos mortais são encontrados, Katie e Missy continuam desaparecidas, mantendo a tensão no ar.
Além da complexidade do caso, a série mergulha nas feridas de Mare. O público descobre aos poucos que ela perdeu o filho para o vício em drogas, uma tragédia que moldou sua personalidade e influenciou sua relação com a família. Criando o neto em meio a um turbilhão de emoções não resolvidas, ela se vê confrontada por seus próprios erros e pela necessidade de seguir em frente. A trama explora com profundidade a forma como o luto e a culpa podem corroer alguém, enquanto o trabalho se torna tanto uma distração quanto um fardo.
Entre os elementos mais sutis da narrativa está o envolvimento de Mare com Richard (Guy Pearce), um escritor cuja presença oferece um contraponto à dureza de sua rotina. Embora o romance não seja o foco, ele adiciona uma camada de humanidade à personagem, mostrando que, apesar de todas as barreiras que ergue ao seu redor, ainda há espaço para conexões genuínas. Richard aparece pontualmente, mas cada uma de suas interações com Mare sugere o desejo dela de se permitir sentir algo além da exaustão e do peso da responsabilidade.
Gravada em 2020 sob rígidos protocolos de segurança devido à pandemia, a produção enfrentou desafios para manter as filmagens. A HBO adotou medidas drásticas, incluindo quarentenas obrigatórias e testes constantes para elenco e equipe. Kate Winslet, por exemplo, realizou impressionantes 145 testes de Covid-19 durante as gravações. Guy Pearce, que teve uma participação menor, também passou por dezenas de exames, revelando o rigor da produção para evitar interrupções.
A caracterização de Mare foi um ponto de atenção. Winslet, aos 45 anos, decidiu encarnar a personagem sem maquiagem, destacando sua aparência despretensiosa e reforçando a ideia de uma mulher que não tem tempo nem disposição para se preocupar com superficialidades. Inicialmente, essa escolha gerou hesitação na HBO, mas acabou sendo essencial para a autenticidade da atuação da atriz, que entrega um dos desempenhos mais marcantes de sua carreira.
Com uma atmosfera densa e personagens profundamente elaborados, a série se insere no mesmo patamar de produções como “Sharp Objects” e “True Detective”. O roteiro bem estruturado, aliado à performance de um elenco afiado, faz dela uma experiência imersiva, capaz de prender a atenção do espectador até o último episódio. Mais do que um mistério a ser solucionado, a narrativa é um estudo sobre perda, redenção e a luta para seguir adiante quando tudo parece desmoronar.
Série: Mare of Easttown
Criação: Brad Ingelsby
Ano: 2021
Gênero: Crime/Drama/Mistério
Nota: 10