Na Netflix: ele topou ser caçado por assassinos durante 30 dias — e acredita ter encontrado a regra perfeita para sobreviver Divulgação / Hulu

Na Netflix: ele topou ser caçado por assassinos durante 30 dias — e acredita ter encontrado a regra perfeita para sobreviver

Se há algo que mantém a existência menos árida e a transforma em um espaço minimamente habitável, são os sonhos. Se cada indivíduo se lançasse sem hesitação na perseguição de seus ideais mais audaciosos, talvez o mundo fosse outro. No entanto, essa busca exige rupturas, abandono de certezas e uma disposição para revisitar territórios internos antes ignorados. Somente ao transitar por esses corredores sombrios, onde se esconde o essencial da experiência humana, é que se abre passagem para algo maior.

Esse é o caminho que Jake Johnson percorre em “Autoconfiança”, uma comédia sagaz e amarga, escrita, estrelada e dirigida por ele, sobre um homem afogado na própria inércia. Conforme a trama se desenrola, cresce a empatia do espectador por Tommy, alguém que, sem perceber, abriu mão de sua individualidade, tornando-se apenas uma sombra de si mesmo. Esse vácuo o empurra a uma escolha inusitada e reveladora, capaz de remodelar sua percepção do real.

A estreia de Johnson na direção chega como uma carga explosiva. Desde a pandemia, tornou-se ainda mais desafiador convencer as pessoas de que os laços interpessoais são imprescindíveis e que, sem uma fuga da dureza cotidiana, a humanidade corre o risco de se desmantelar. Sonhar pode ser um convite ao fracasso ou um motor de transformação.

Quando a vida se converte em um ciclo indistinto, repetindo-se sem marcações perceptíveis, é necessário romper com o ordinário. Tommy se vê diante dessa encruzilhada: já não distingue o que pertence à realidade concreta e o que não passa de uma fabricação mental, uma ilusão alimentada por frustrações e desejos não realizados.

Vivido com entrega por Johnson, o protagonista encarna o paradoxo da loucura benéfica — porque até o delírio possui diferentes facetas. Ele oscila entre a ruína e a reinvenção, levado por forças que não compreende inteiramente. O ponto de virada se dá quando entra na limusine de Andy Samberg, que assume uma versão excêntrica de si mesmo. Em busca de qualquer distração para esquecer o fim de um relacionamento de 23 anos com Theresa (Natalie Morales), Tommy se entrega a uma experiência limítrofe, cuja consequência é incerta.

O filme se estrutura como um comentário mordaz sobre o espetáculo da exposição e a exploração do indivíduo como peça descartável de uma engrenagem lucrativa. Ao mesmo tempo que diverte, a narrativa expõe as fissuras de uma sociedade que reduz a vida a uma sucessão de entretenimentos anestesiantes, onde a angústia alheia se torna um espetáculo público. O desfecho, ainda que inevitável, ressoa como um golpe seco e memorável.

Filme: Autoconfiança
Diretor: Jake Johnson
Ano: 2023
Gênero: Comédia
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★