Duvido que você consiga segurar suas lágrimas depois de assistir esse filme belíssimo com Julia Roberts, na Netflix Dale Robinette / Studiocanal

Duvido que você consiga segurar suas lágrimas depois de assistir esse filme belíssimo com Julia Roberts, na Netflix

Stephen Chbosky revisita os desafios da infância com um olhar afiado em “Extraordinário” (2017), construindo uma narrativa sensível sobre as descobertas de um garoto singular que aprende a lidar com um mundo que nem sempre está pronto para acolhê-lo. Baseado no romance homônimo de R.J. Palacio, o longa acompanha August Pullman em um momento crucial de sua trajetória. Nascido com uma condição genética rara que afeta a estrutura óssea e a pele do rosto, Auggie travou uma batalha pela sobrevivência desde os primeiros instantes de vida. 

O roteiro, assinado pelo próprio diretor em colaboração com Jack Thorne e Steve Conrad, rememora esse início dramático através de um flashback impactante, no qual sua mãe, interpretada por Julia Roberts, enfrenta a apreensão do parto de um bebê que precisaria de incontáveis intervenções cirúrgicas para se manter vivo. A cena reforça um aspecto crucial da história: Auggie é um sobrevivente, mas também um menino que deseja ser visto para além de sua condição.

Palacio concebeu a ideia do livro após um encontro casual em uma sorveteria com uma criança de características similares às de Auggie, mas as semelhanças com a história de Roy Lee Dennis (1961-1978) são evidentes. Conhecido como Rocky, Roy viveu com displasia craniodiafisária, uma doença rara que provocava calcificação excessiva no crânio, resultando em deficiências visuais e auditivas. 

Sua história inspirou “Marcas do Destino” (1985), filme de Peter Bogdanovich que retratou a jornada de um jovem nos anos 1970, em um período de efervescência cultural e liberdade, mas ainda marcado por barreiras intransponíveis para alguém como ele. A principal diferença entre os protagonistas está no tom: enquanto Rocky enfrentava a vida com um realismo amargo, Auggie tem uma infância protegida, cercado pelo afeto inabalável da mãe.

Isabel, vivida por Roberts, abdica de sua carreira como ilustradora e de uma tese de mestrado para se dedicar integralmente ao filho, educando-o em casa até decidir que ele está pronto para ingressar na escola. A mudança gera resistência em Nate (Owen Wilson), seu pai, mas ele acaba cedendo. A transição de Auggie para a nova rotina escolar não é só um marco para ele, mas também para sua irmã Olivia (Izabela Vidovic), que sempre viveu à sombra do caçula. Com a perda da avó, sua única confidente, Olivia se vê solitária, e sua história se desdobra paralelamente à de Auggie, trazendo uma perspectiva complementar sobre o impacto da condição dele na dinâmica familiar.

A adaptação de Auggie à escola vem acompanhada de desafios previsíveis: o bullying, aqui combatido pela firme intervenção do diretor Tushman (Mandy Patinkin), e a necessidade de distinguir amizades verdadeiras de aproximações interesseiras. A jornada do garoto reflete as tensões universais do crescimento, mas é amplificada por sua aparência incomum, tornando cada interação um teste de aceitação. 

A interpretação de Jacob Tremblay é um dos pontos altos do longa. O ator, que já havia se destacado em “O Quarto de Jack” (2015), confere ao protagonista uma complexidade que transita entre vulnerabilidade e resiliência. Seu desempenho torna palpável a experiência de Auggie, um menino que anseia por conexões autênticas, mas precisa lidar com a realidade cruel dos olhares e das primeiras impressões.

Se a trama mantivesse seu foco exclusivo na jornada de Auggie, talvez alcançasse um impacto ainda maior. O filme se aproxima da grandiosidade ao construir uma reflexão tocante sobre empatia e superação, mas dispersa parte de sua força ao diluir sua narrativa em subtramas paralelas. Ainda assim, “Extraordinário” encontra seu brilho ao traduzir os dilemas de um menino que deseja apenas ser aceito, sem precisar carregar o peso de ser um exemplo. 

Tremblay carrega o filme com notável maturidade, conduzindo o público a um universo onde cada gesto de aceitação se torna uma vitória silenciosa. Mais do que um drama sobre diferenças, Chbosky entrega uma história sobre a universalidade do desejo de pertencer.

Filme: Extraordinário
Diretor: Stephen Chbosky
Ano: 2017
Gênero: Drama
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★