4,5 bilhões em bilheteria e 442 dias no topo da Netflix — e você ainda não assistiu? Divulgação / Sony Pictures

4,5 bilhões em bilheteria e 442 dias no topo da Netflix — e você ainda não assistiu?

A luta pela sobrevivência impele-nos a assumir uma postura mais agressiva diante dos outros e esse personagem não demora a ser incorporado à nossa natureza, com a providencial ajuda das várias dificuldades que se agigantam nos cenários extremos em que a vida, caprichosa e vingativa, transforma-se numa arena onde se chega para matar ou para morrer. Indivíduos são esbulhados de seu arbítrio e de sua sensibilidade e se convertem num prolongamento da consciência coletiva, não pensam mais pela própria cabeça e veem-se obrigados a se submeter a expedientes os mais vis, não por covardia, mas por não poderem contar com ninguém. A desordem fundamental que perpassa a vida do homem na Terra ainda não alcançou o estado de tétrico refinamento exibido com ostentação em produções de todos os gêneros, o que não quer dizer que nossa situação seja confortável, ou mesmo admissível. 

A seu modo, “Jumanji: Próxima Fase” espelha essas mudanças pelas quais passa o gênero humano de tempos em tempos, e como todo bom videogame, agora o jogo está mais confuso. Como em “Jumanji: Bem-vindo à Selva” (2017), Jake Kasdan continua a mostrar as aventuras — e, principalmente, as desventuras — de quatro estudantes do ensino médio teletransportados para um universo paralelo através de um console de videogame dos anos 1990, onde assumem novas identidades com os avatares de heróis paradigmáticos. Kasdan e os corroteiristas Jeff Pinkner e Scott Rosenberg batem na tecla do avanço tecnológico, voltando ao filme inaugural, de 1995, dirigido por Joe Johnston, para fazer um apontamento, tão curioso quanto trágico. 

O universo é vasto demais para ser governado por homens mesquinhos, assombrosamente ineptos, cuja visão míope acerca da vida acaba por fomentar insurreições de consequências imprevisíveis espalhando-se de galáxia em galáxia até que tudo redunde num enorme buraco negro. Enquanto isso não acontece, mudamos ao sabor das contingências, bem como também causa espécie que nossa natureza mesma reforja-se de acordo com o sem fim de revoluções tecnológicas que seguimos experimentando, mormente nas últimas três décadas. Spencer fora admitido na Universidade de Nova York e, por essa razão, não consegue manter o namoro com Martha, a personagem de Morgan Turner. A volta para casa nas férias de Natal só não é mais infausta porque ele tem a companhia do avô Eddie, e na introdução, Alex Wolff e Danny DeVito regalam o público com cenas entre engraçadas e comoventes, um prólogo eficaz para o que vem pouco depois. 

Spencer desce ao porão, e como ele não retorna, Bethany e Fridge, os amigos que o haviam ido visitar interpretados por Madison Iseman e Ser’Darius Blain, fazem o mesmo caminho e deparam-se com um estranho dispositivo ligado a um velho aparelho de televisão. Em instantes, todos encontram-se na outra dimensão de Jumanji, mas à diferença do que ocorre nas edições anteriores da série, seus alter egos foram grosseiramente trocados. É o sinal para que Dwayne Johnson, Karen Gillan, Kevin Hart e Jack Black tomem o comando, sem nenhuma grande surpresa, mas dizendo de um jeito leve que apenas em sonho a humanidade dá a impressão de evoluir. Sonhemos, pois.

Filme: Jumanji: Próxima Fase
Diretor: Jake Kasdan
Ano: 2019
Gênero: Aventura/Comédia
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★
Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.