Bridgerton para adultos: o épico inteligente e pitoresco na Netflix Divulgação / Universal Pictures

Bridgerton para adultos: o épico inteligente e pitoresco na Netflix

A opulência, com seu brilho sedutor, carrega um fardo invisível: a necessidade incessante de autopreservação. Observados de perto pela sociedade e cativos de seus próprios temores, os privilegiados constroem redomas de exclusividade para perpetuar seu domínio. Entre rituais refinados e estratégias sutis, eles cultivam a ilusão de estabilidade, mas vivem sob a ameaça constante de que suas fortunas possam ruir sem aviso. “Downton Abbey” transforma essa dinâmica em narrativa, explorando os bastidores de uma aristocracia que, por trás das aparências impecáveis, enfrenta dilemas universais.

Quando Michael Engler levou a aclamada série para os cinemas em 2019, preservou o encanto que por seis temporadas conquistou milhões de espectadores. Três anos depois, Simon Curtis assumiu o desafio de expandir esse universo com “Downton Abbey 2: Uma Nova Era”. A trama, agora dividida entre o cenário deslumbrante da Riviera Francesa e a imponente propriedade britânica dos Crawley, entrelaça o passado e o presente da família, adicionando um novo grau de complexidade à narrativa. Enquanto uma inesperada herança desafia a matriarca Violet Crawley, a imponente abadia torna-se palco de uma produção cinematográfica, equilibrando ironia e sofisticação.

Julian Fellowes, roteirista e criador da série, constrói uma história que mescla nostalgia e renovação. A surpresa envolvendo a herança de Violet não apenas impulsiona o enredo, mas também serve como um catalisador para reflexões sobre memória e pertencimento. Em paralelo, a incursão do cinema na propriedade dos Crawley remete à transição do cinema mudo para o falado, evocando clássicos como “Cantando na Chuva” (1952) e estabelecendo diálogos sutis com a literatura de Jane Austen. Os personagens, presos entre os códigos de sua época e as inevitáveis transformações sociais, transitam entre a vaidade e a vulnerabilidade, revelando nuances que ampliam a riqueza da narrativa.

Curtis imprime sua assinatura visual ao explorar o contraste entre a exuberância do sul da França e a contenção britânica, utilizando a fotografia para pontuar as tensões latentes. Embora o longa não rompa com as convenções do gênero, encontra força no detalhamento emocional e na dinâmica entre os personagens. O humor afiado e as trocas espirituosas continuam sendo a espinha dorsal da história, enquanto subtramas cuidadosamente entrelaçadas garantem profundidade à trama. A abordagem das mudanças culturais é sutil, mas eficaz, sugerindo que, mesmo em um mundo pautado pela tradição, a modernidade se infiltra de maneira inevitável. Em vez de discursos grandiosos, a narrativa privilegia pequenas transformações, reveladas nos gestos e diálogos meticulosamente construídos.

Mais do que uma sequência, “Uma Nova Era” funciona como uma reflexão sobre a perenidade e a impermanência. Seja sob o sol vibrante da Riviera ou nos corredores solenes de Downton, a obra reafirma a essência da série: uma análise sofisticada das contradições humanas, onde tradição e mudança coexistem em um equilíbrio delicado. Com elegância e sensibilidade, o filme reafirma que, mesmo quando tudo parece inabalável, a vida segue, moldando o futuro sobre os alicerces do passado.

Filme: Downton Abbey 2: Uma Nova Era
Diretor: Simon Curtis
Ano: 2022
Gênero: Drama/Épico/Romance
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★