Tão bom quanto o livro: romance gótico no Prime Video é uma das mais belas e sombrias histórias de amor de todos os tempos Divulgação / Focus Features

Tão bom quanto o livro: romance gótico no Prime Video é uma das mais belas e sombrias histórias de amor de todos os tempos

Na rigorosa sociedade inglesa do século XIX, a jovem órfã Jane Eyre (Mia Wasikowska) cresce à margem do privilégio, apesar de sua origem abastada. Rejeitada pela tia, é enviada a um internato onde experimenta a dureza da disciplina e as condições severas que moldam sua resiliência. Inspirada pelas memórias de Charlotte Brontë sobre sua própria vivência no colégio religioso de Cowan Bridge, a história de Jane em Lowood School retrata um ambiente marcado por austeridade e negligência, onde a frieza institucional e a precariedade culminam na morte de algumas alunas.

Já adulta, Jane, dotada de inteligência e firmeza de caráter, torna-se governanta na propriedade de Edward Fairfax Rochester (Michael Fassbender), um aristocrata enigmático e impenetrável. O primeiro encontro entre ambos se dá de maneira acidentada: ao atravessar a floresta em direção aos correios, Jane assusta o cavalo de Rochester, levando-o a uma queda que o deixa ferido. Sem reconhecer seu empregador, ela age com cautela e distanciamento ao oferecer ajuda, enquanto ele, mal-humorado, reage com irritação e sarcasmo. Esse primeiro contato estabelece a tônica de sua relação, marcada por estranheza e tensão latente.

Ao longo de seus diálogos, Rochester revela um temperamento austero e inquisitivo, observando Jane com olhos penetrantes e impondo perguntas que testam sua perspicácia. Há nele algo de ameaçador, uma presença que oscila entre o domínio e a inquietação. Jane, por sua vez, carrega uma melancolia silenciosa, um reflexo dos anos de rejeição e da perda prematura de Helen (Freya Parks), sua única amiga em Lowood. Por trás de sua aparência imperturbável, oculta um turbilhão de dores e uma hesitação persistente em confiar no mundo ao seu redor. Sua vida inteira foi uma sucessão de abandonos, e a expectativa de felicidade lhe parece uma promessa sempre fora de alcance.

Quando o vínculo entre os dois se aprofunda, Jane se permite acreditar que pode enfim encontrar afeto e pertencimento. Rochester, mesmo avesso a gestos afáveis, demonstra um apreço contido, o suficiente para alimentar sua esperança. Mas há sombras em Thornfield Hall que anunciam desdobramentos inesperados. O homem que Jane imagina ter conquistado esconde segredos inconfessáveis, e a revelação desses mistérios devastará suas expectativas de um futuro ao lado dele. Rochester, apesar de sua dureza, vê-se tocado pelo espírito de Jane, uma presença tão frágil quanto resiliente. O amor que compartilham se manifesta em promessas sussurradas e beijos contidos, um romance tecido no subtexto de olhares e palavras reticentes.

Quando a verdade se impõe, Jane opta pela fuga, abandonando não apenas Rochester, mas também a si mesma como sempre se conheceu. No entanto, a conexão entre eles resiste à distância, uma ligação etérea que se mantém viva mesmo na ausência. A intensidade do que viveram reverbera em sua mente, ecoando no chamado distante de Rochester por seu nome, como se suas almas continuassem entrelaçadas além do tempo e do espaço.

A direção de Cary Joji Fukunaga acentua a atmosfera gótica da narrativa, utilizando cenários de luz escassa e paleta fria para intensificar a sensação de isolamento e opressão. A ausência de iluminação artificial reforça o rigor do inverno, que permanece imutável mesmo com a chegada da primavera. A própria produção enfrentou desafios em uma locação tão remota que sequer havia sinal telefônico, obrigando a equipe a recorrer a um sistema rudimentar de comunicação.

Longe de ser um romance convencional, a obra explora a introspecção e a profundidade psicológica de seus personagens, com um desenvolvimento que privilegia a sutileza em detrimento da grandiosidade. O roteiro não se entrega a demonstrações óbvias de paixão, exigindo do espectador uma leitura atenta das nuances da relação entre Jane e Rochester. A produção foi reconhecida no Oscar pela excelência do figurino, um trabalho minucioso de Michael O’Connor, e a trilha sonora de Dario Marianelli confere ainda mais peso à melancolia da trama.

Filme: Jane Eyre
Diretor: Cary Joji Fukunaga
Ano: 2011
Gênero: Romance
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★