Melhor atuação de Tom Hanks desde “Náufrago”, filme está dando adeus à Netflix Divulgação / Columbia Pictures

Melhor atuação de Tom Hanks desde “Náufrago”, filme está dando adeus à Netflix

Paul Greengrass se firmou como um dos mais habilidosos cronistas do caos moderno, explorando episódios de tensão extrema que oscilam entre o heroísmo e o desespero. “Capitão Phillips”, um relato tão extraordinário que só poderia ser real, reforça essa vocação, já demonstrada em “Voo United 93” (2006). A história acompanha o comandante do cargueiro MV Maersk Alabama, que em 8 de abril de 2009, durante o transporte de alimentos para doação, vê sua rotina ser abruptamente transformada por um ataque pirata.

Quando percebe a aproximação dos somális, Phillips age rápido e inicialmente consegue despistá-los. Mas a trupe criminosa não recua e, na segunda tentativa, consegue invadir a embarcação. O que se segue é uma sucessão de eventos frenéticos, todos conduzidos com maestria por Greengrass. Em menos de vinte minutos de projeção, o público já está imerso em uma das narrativas mais eletrizantes do cinema recente.

A trama se desdobra num embate tenso entre Phillips e Muse, o líder dos invasores. Mesmo encurralado, o capitão nunca se entrega por completo, utilizando estratagemas para desestabilizar seus sequestradores. Greengrass, contudo, vai além da construção de um suspense engenhoso e traça um retrato sociológico pungente: os piratas não são meros vilões de folhetim, mas produtos de um país devastado pela miséria e pela guerra. São brutais, sim, mas também desesperados, imersos em uma realidade sem alternativas. A performance magnética de Barkhad Abdi, que encarna Muse com uma naturalidade arrebatadora, adiciona camadas de complexidade à história.

A interação entre Abdi e Tom Hanks é um dos grandes trunfos do longa. Hanks, um dos nomes mais sólidos de Hollywood, transita com destreza entre o estoicismo e a vulnerabilidade. Seu Phillips é um homem prático, meticuloso, que suprime o pânico até quando se vê sem escapatória. Mas o impacto emocional de sua atuação atinge o ápice nos momentos finais, quando ele finalmente sucumbe ao trauma vivido.

Se há algo questionável na estrutura do filme, talvez seja a breve introdução doméstica de Phillips com sua esposa, interpretada por Catherine Keener. A cena parece um adendo um tanto forçado para humanizá-lo, como se sua conduta ao longo do enredo já não cumprisse esse papel. No entanto, é um detalhe menor diante da potência do que vem a seguir. Greengrass constrói um thriller que mescla imersão documental com intensidade cinematográfica, utilizando câmera na mão e luz natural para amplificar a sensação de realismo.

A ironia cruel da história está na conclusão de seus personagens. Muse, ao contrário da narrativa bíblica de Davi contra Golias, jamais teve chances reais de vitória: seu destino final é uma prisão de segurança máxima nos Estados Unidos. Phillips, por sua vez, retorna ao trabalho após uma breve licença. Não há redenção gloriosa para nenhum deles, apenas a constatação brutal da realidade. E talvez seja justamente essa abordagem crua que faz de “Capitão Phillips” um filme tão memorável. Greengrass nos lembra que, em um mundo mergulhado na escuridão, algumas histórias não oferecem vitórias triunfantes, mas, no máximo, a sobrevivência como um lampejo de esperança.

Filme: Capitão Phillips
Diretor: Paul Greengrass
Ano: 2013
Gênero: Ação/Thriller
Avaliação: 10/10 1 1
★★★★★★★★★★