Eleito um dos filmes do século: o maior faroeste da história do cinema está na Netflix Divulgação / Paramount Pictures

Eleito um dos filmes do século: o maior faroeste da história do cinema está na Netflix

Com o passar dos anos, a estatura artística de Sergio Leone (1929-1989) só se torna mais evidente. O cineasta transformou a desolação do Velho Oeste em um palco de poesia visual, habitado por figuras endurecidas, envoltas em dilemas insolúveis e paixões marcadas por distâncias físicas e imposições sociais. Em um território onde a lei é frágil e os poderosos a dobram conforme seus interesses, a cobiça se sobrepõe a qualquer código moral, convertendo a sobrevivência em um jogo brutal de poder e dinheiro.

No épico “Era uma Vez no Oeste”, Leone alcança um equilíbrio raro entre a intensidade dramática e o compasso lento que caracteriza sua narrativa. O tempo parece se arrastar nos confins americanos da década de 1870, enquanto os conflitos se desenrolam sem pressa, esculpidos pelo roteiro coescrito com Dario Argento e Sergio Donati (1933-2024). A cada cena, o diretor expande sua trama com precisão cirúrgica, tecendo um emaranhado de ambições, traições e vinganças que convergem gradualmente para um embate inevitável.

Recorrendo a todos os elementos que fazem de sua filmografia um referencial, Leone molda a atmosfera com detalhes meticulosos. A trilha de Ennio Morricone (1928-2020) embala os momentos de brutalidade iminente e insere nuances cômicas ou românticas, conduzindo a audiência por um labirinto de expectativas e enganos. Disputas por terras, duelos fatais, bandoleiros em busca de fortuna, trens repletos de sonhadores e desajustados — o filme se debruça sobre esses aspectos e os entrelaça com maestria na transição do primeiro para o segundo ato. A condução meticulosa de Leone estende a tensão ao limite, explorando cada detalhe antes de soltar as amarras do enredo.

Jill, interpretada por Claudia Cardinale, é a peça que altera o tabuleiro. Mulher de passado nebuloso, desperta desejo e inquietação em todos ao seu redor. Ao casar-se com o rancheiro Brett McBain, vivido por Frank Wolff (1928-1971), ela se adapta à rotina da cidade, não por aceitação espontânea da comunidade, mas pela influência do marido. No entanto, sua viuvez transforma sua existência em um alvo. Fazendeiros abastados e oportunistas vislumbram nela uma chance de consolidar fortuna e domínio, inserindo-a em uma disputa que vai além de sua vontade.

Ainda que não fosse o centro planejado da narrativa — uma curiosidade de bastidor revela que Cardinale ameaçou abandonar a produção caso Leone insistisse em um enquadramento indecoroso —, sua presença se torna a alma do filme. Seu magnetismo influi na intensidade das atuações de Charles Bronson (1921-2003), como o enigmático Homem da Gaita, e Henry Fonda (1905-1982), encarnando o impiedoso Frank, ambos conduzidos a um duelo antológico. Assim, mesmo dentro da tradição do spaghetti western, “Era uma Vez no Oeste” carrega um sopro de renovação, reafirmando Leone como mestre na arte de transcender os limites do gênero.

Filme: Era uma Vez no Oeste
Diretor: Sergio Leone
Ano: 1968
Gênero: Ação/Faroeste
Avaliação: 10/10 1 1
★★★★★★★★★★