Em meio a uma avalanche de produções previsíveis, “Bagagem de Risco” se distingue ao transformar uma premissa direta em uma experiência envolvente, consolidando-se como um dos thrillers psicológicos mais instigantes do catálogo da Netflix. Sob a direção de Jaume Collet-Serra, mestre em construir narrativas de alta tensão, o filme mergulha o espectador em um ambiente sufocante e imprevisível, explorando a paranoia e o perigo latente em um aeroporto em plena atividade.
A trama acompanha Ethan Kopek (Taron Egerton), um jovem agente da TSA que vê sua rotina profissional se desintegrar diante de um dilema aterrador. O que deveria ser apenas um degrau em sua trajetória rumo à polícia rapidamente se torna um jogo mortal, quando ele é coagido a permitir a passagem de uma mala suspeita. Com sua namorada, Nora (Sofia Carson), usada como moeda de troca, Ethan se vê encurralado por um traficante de armas interpretado com precisão cirúrgica por Jason Bateman. Guiado à distância por meio de um ponto eletrônico, o protagonista se transforma em peça central de um esquema onde cada escolha pode ser fatal.
A visão de Collet-Serra confere ao aeroporto uma presença quase onírica, que vai além do simples pano de fundo. As câmeras de segurança hackeadas pelo antagonista extrapolam sua função habitual e tornam-se uma extensão de seu domínio, intensificando a sensação de claustrofobia e vigilância constante. O diretor utiliza cortes ágeis e enquadramentos inesperados para refletir o estado de espírito de Ethan, enquanto detalhes sonoros, como o ruído metálico das esteiras e os diálogos em segundo plano, constroem um ambiente carregado de tensão.
O ritmo do filme alterna entre momentos de aparente calmaria e reviravoltas eletrizantes, cuidadosamente calculadas para prender a atenção do espectador. Cada cena é meticulosamente elaborada para fortalecer o embate psicológico entre Ethan e seu manipulador, conduzindo a narrativa com precisão implacável e mantendo o público constantemente à beira do desespero.
T.J. Fixman assina um roteiro que vai além do suspense convencional, explorando dilemas éticos e morais de maneira instigante. Ethan é forçado a lidar com escolhas que transcendem a simples luta entre certo e errado, aproximando-se de debates filosóficos como o “Dilema do Bonde”. Seu crescimento ao longo da trama reflete não apenas um amadurecimento pessoal, mas também a complexidade de um protagonista que precisa encontrar coragem em meio ao caos.
Jason Bateman entrega uma atuação hipnotizante, equilibrando sarcasmo e ameaça com uma precisão perturbadora. Seu vilão não precisa de grandes gestos para impor sua presença; cada palavra, cada pausa e cada entonação transformam suas interações com Ethan em momentos de pura tensão. O elenco de apoio também brilha: Dean Norris confere credibilidade ao retrato da rotina aeroportuária, enquanto Danielle Deadwyler, como a detetive Elena Cole, adiciona um elemento investigativo que enriquece a narrativa, mesmo que sua subtrama não seja totalmente explorada. Já Nora, interpretada por Sofia Carson, vai além do clichê de interesse romântico, oferecendo uma conexão emocional autêntica com o protagonista.
Recusando-se a recorrer a exageros visuais ou explosões gratuitas, “Bagagem de Risco” aposta em um realismo contundente. Sequências como a luta no setor de bagagens demonstram um cuidado técnico que prioriza impacto emocional e verossimilhança, reforçando a maturidade da produção. Essa abordagem ressalta a força da narrativa e das performances, elementos que garantem a imersão do espectador.
O grande trunfo do filme reside em sua capacidade de extrair intensidade de uma estrutura aparentemente simples. Em vez de reinventar o gênero, a obra reafirma o poder de uma história bem contada, onde cada decisão tem peso e cada cena contribui para a crescente sensação de perigo iminente. Collet-Serra conduz o espectador por um thriller afiado, que transcende o mero entretenimento e levanta reflexões sobre sacrifícios, moralidade e resistência diante da adversidade.
Com atuações magnéticas, direção afiada e um roteiro que sabe manipular a tensão com maestria, “Bagagem de Risco” se impõe como um dos mais memoráveis thrillers recentes da Netflix. Em um mercado saturado por produções que buscam complexidade sem propósito, o filme prova que a simplicidade bem executada pode ser devastadoramente eficaz. Uma experiência intensa e envolvente, que prende o espectador até o último instante.
★★★★★★★★★★