Três anos atrás, espectadores de todo o mundo foram apresentados a uma nova face da ganância e do desespero, uma que, até então, não havia sido retratada com tamanha crueza. Uma sequência de desafios desumanos, centrados em indivíduos socialmente vulneráveis, prontos para tudo em troca de dinheiro, evocava uma dinâmica já conhecida da televisão brasileira dos anos 1990, mas levada a um patamar muito mais extremo, onde a humilhação era apenas o primeiro estágio de um jogo brutal. O fenômeno global de “Round 6” não teria alcançado tamanha magnitude sem a compulsão humana pelo macabro, geralmente justificada pelo véu de uma suposta empatia, conceito tantas vezes diluído pelo uso oportunista e mercadológico.
Nesta continuação, dividida em sete episódios, Hwang Dong-hyuk revisita os acontecimentos da temporada inicial, por vezes expandindo as tramas previamente estabelecidas, por outras, introduzindo novos conflitos e personagens, estratégia que pode tanto cativar como alienar parte do público. O diretor-roteirista arrisca ao equilibrar ação e drama em uma narrativa meticulosamente elaborada, distribuída ao longo de sete horas que alternam entre momentos genuinamente instigantes e outros menos substanciais.
O primeiro movimento da trama recapitula os eventos decisivos da fase anterior. O protagonista, Seong Gi-hun, abdica de sua viagem aos Estados Unidos para investigar as engrenagens do jogo mortal. A busca pelo misterioso Vendedor, o recrutador dos participantes, permite que Lee Jung-jae e Gong Yoo entreguem performances marcantes, garantindo envolvimento ao espectador que busca algo além da adrenalina. Nos dois primeiros episódios, Hwang ancora sua história em uma metáfora visual que desnuda a degradação moral em troca da sobrevivência. A jornada de Gi-hun o leva a uma escolha inevitável: a única maneira de desvendar os segredos do jogo é retornar ao campo de batalha, e é nesse ponto que a narrativa começa a se enredar em suas próprias ambições.
Havia aqui a oportunidade perfeita para uma abordagem mais enxuta, que permitisse aos protagonistas brilhar novamente com a força interpretativa que os consolidou como astros globais. No entanto, a inserção excessiva de personagens secundários compromete o ritmo, tornando o enredo, em certos momentos, hermético para quem não está completamente imerso na mitologia da série. Além disso, polêmicas periféricas, como a escolha de um ator cisgênero para um papel de mulher trans, pouco contribuem para o debate e apenas adicionam camadas de distração a um enredo já sobrecarregado.
A qualidade técnica da produção permanece inquestionável. O rigor estético transparece em todos os detalhes, desde a direção de arte precisa de Gim En-jee e Han Jaehyun, passando pela fotografia minuciosa de Lee Hyeong-deok, até os figurinos de Jo Sang-gyeong e a maquiagem elaborada por Tae-hee Jo. Hwang mantém sua habilidade cirúrgica em expor a miséria da condição humana, evidenciando como a necessidade financeira pode eclipsar qualquer resquício de dignidade. No entanto, a nova temporada perde fôlego antes de atingir seu clímax, e a já anunciada continuação para 2025 parece menos um desdobramento orgânico da história e mais uma decisão impulsionada pelo mesmo espetáculo cruel que a série critica. O jogo arrefeceu. Fim de partida.
Série: Round 6 — Segunda temporada
Direção: Hwang Dong-hyuk
Anos: 2021-2024
Gêneros: Thriller
Nota: 7/10