Mais brutal, mais premiado, mais explosivo que John Wick: o rei da ação está na Netflix Divulgação / Warner Bros.

Mais brutal, mais premiado, mais explosivo que John Wick: o rei da ação está na Netflix

Após quase dez anos afastado das telas, Wong Ching-Po retorna com uma abordagem renovada em “Os Três Males”, uma produção taiwanesa que alia violência crua e profundidade emocional. Inspirado em uma fábula chinesa, o longa desconstrói clichês do universo dos gângsteres ao explorar a herança de um passado marcado por sangue e redenção. Desta vez, Wong abandona os excessos estilísticos que marcaram sua filmografia anterior e opta por uma condução mais objetiva e implacável, sem sacrificar a intensidade que o consagrou.

O enredo gira em torno de Chen Kui-lin, um matador de aluguel interpretado com visceralidade por Ethan Juan. Na lista dos criminosos mais procurados de Taiwan, ele descobre que tem câncer de pulmão em estágio terminal. Em um primeiro momento, a ideia de se entregar à polícia parece inevitável, mas a frieza com que é tratado o leva a uma decisão inesperada: erradicar os dois criminosos que ocupam posições superiores na hierarquia do crime. Assim, inicia uma caçada feroz contra Hongkie, um líder de gangue impiedoso vivido por Ben Yuen, e Lin Lu-ho, um manipulador ardiloso interpretado por Chen Yi-wen.

A brutalidade explícita permeia cada cena, transformando a violência em elemento narrativo essencial. Ossos se estilhaçam, sangue se espalha e a morte se impõe sem romantizações. Hongkie, cuja selvageria transcende o físico e invade o psicológico ao submeter Cheng Hsiao-mei (interpretada por Gingle Wang) a um terror silencioso, se opõe à sutileza de Lin Lu-ho, que atua nos bastidores com frieza cirúrgica. Entre esses extremos, Wong insere momentos de respiro estratégico, subvertendo expectativas com soluções visuais engenhosas, como o uso de reflexos para revelar armas ocultas, mantendo a tensão sempre no limite.

O rumo da narrativa se altera drasticamente quando Kui-lin encontra um culto religioso e descobre que Lin Lu-ho já está morto. Esse evento redefine seu percurso, transformando a trama em um estudo de sua psique. Wong joga com a perspectiva do espectador, deixando indícios do desfecho enquanto mantém o suspense sobre as decisões do protagonista. Embora a resistência física de Kui-lin em meio a ferimentos fatais desafie a lógica, a carga emocional do filme sobrepõe qualquer incoerência, sustentando a imersão do público.

Nos momentos finais, o longa se aproxima da tragédia, conduzindo um confronto final que combina espetáculo e peso dramático. O tiroteio derradeiro, conduzido com maestria, não apenas encerra a jornada do protagonista, mas também adiciona camadas inesperadas de humanidade às figuras que antes pareciam meros arquétipos da violência. O encerramento amargo ressoa como um adeus melancólico, reforçando a dualidade entre destruição e legado.

Em “Os Três Males”, Wong Ching-Po demonstra uma evolução notável ao construir um thriller que rompe com convenções. Se a primeira metade do filme evoca a tensão de um suspense coreano, a segunda abraça uma atmosfera onírica que remete ao cinema de Sion Sono. Entre reviravoltas implacáveis e um lirismo soturno, o filme se firma como uma experiência marcante, consolidando o nome de Wong como um dos mais intrigantes realizadores do gênero. Com uma execução que mescla brutalidade e contemplação, o longa desafia limites e entrega uma narrativa impactante, na qual a violência não é apenas espetáculo, mas também reflexão sobre poder, vingança e redenção.

Filme: Os Três Males
Diretor: Wong Ching-Po
Ano: 2023
Gênero: Ação/Drama
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★