Ao longo das décadas, o cinema construiu a imagem dos russos como antagonistas implacáveis, figuras que transcendiam o contexto político da Guerra Fria para se tornarem ícones culturais, como exemplificado por personagens memoráveis como Xenia Onatopp, de “007 Contra GoldenEye” (1995). No entanto, em “Sem Remorso”, os russos retornam, mas em uma versão diluída de sua antiga vitalidade, tornando-se apenas mais um elemento genérico em uma trama sem alma. Embora recheado de ação, o filme falha em imprimir originalidade e profundidade emocional, entregando uma experiência mediana.
A narrativa acompanha John Kelly, vivido por Michael B. Jordan, um SEAL da Marinha devastado após o assassinato brutal de sua esposa grávida, em uma emboscada orquestrada como retaliação de um erro militar americano. Este evento desencadeia sua jornada de vingança implacável contra os responsáveis, mas, ao longo da trama, a conexão entre o público e os personagens permanece superficial. O roteiro não constrói relações significativas, e até mesmo o sofrimento de Kelly é tratado com uma frieza que limita o impacto emocional da história.
Em sua busca por justiça, Kelly adota uma abordagem impiedosa e sem autorização, destruindo todos os envolvidos na morte de sua esposa. Entre os momentos de maior violência, uma sequência no Aeroporto Dulles se destaca, onde o protagonista transforma o SUV de um criminoso em uma arma ardente, em um interrogatório brutal. A ação é estilizada e eficiente, mas o filme tropeça na falta de inovação, tornando-se repetitivo e previsível, o que quebra o ritmo e prejudica a tensão.
Stefano Sollima, conhecido por sua habilidade em coreografar cenas intensas, traz uma direção competente para o filme, mas não consegue escapar da limitação de um enredo excessivamente previsível. O clímax em território russo, filmado em sets artificiais, carece da intensidade que se esperava. O confronto final, recheado de tiroteios e clichês, falha em criar uma sensação de urgência, comprometendo a entrega do filme.
Entre os poucos destaques, a performance de Jodie Turner-Smith como a Tenente-Comandante Karen Greer confere um toque de autoridade e complexidade à trama, contrastando com a superficialidade dos demais personagens. No entanto, o elenco, composto por nomes como Jamie Bell e Guy Pearce, é subutilizado, resultando em papéis rasos que não fazem jus ao talento dos atores. A adaptação, embora modernize o enredo, perde a essência do romance original de Tom Clancy, substituindo as questões profundas e os dilemas internos por uma busca incessante por ação. O final, previsível e repleto de conspirações, oferece uma resolução apressada que desilude pela falta de criatividade.
Ainda assim, a força de Michael B. Jordan como protagonista permanece como o único ponto que consegue sustentar parte do filme. Sua performance e presença física conferem alguma dignidade ao enredo, embora o roteiro e direção falhem em apoiar sua jornada. Com uma possível sequência baseada no universo de Clancy, fica a dúvida sobre se os cineastas terão coragem de explorar novas narrativas ou se seguirão a fórmula já desgastada.
★★★★★★★★★★