Filme favorito de Tarantino em 2024 surpreende ao ser indicado ao Framboesa de Ouro de pior filme de 2025 Divulgação / Warner Bros.

Filme favorito de Tarantino em 2024 surpreende ao ser indicado ao Framboesa de Ouro de pior filme de 2025

Ao chegar aos cinemas, “Coringa” gerou uma onda de polarização, atraindo elogios pela ousadia estética e, simultaneamente, críticas pela abordagem controversa sobre saúde mental e masculinidade tóxica. Em “Coringa: Delírio a Dois”, Todd Phillips desafia novamente as expectativas ao abandonar o tom sombrio do primeiro filme e mergulhar em um território inesperado: um musical psicodélico e fragmentado, onde a narrativa é distorcida pelas alucinações de Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) e Lee Quinzel (Lady Gaga), em meio a uma trama que mistura delírios compartilhados e drama de tribunal.

Dessa vez, a violência não é apresentada como uma reação visceral, mas como consequência de um homem que perdeu o controle de sua própria narrativa. Fleck, encarcerado no Asilo Arkham, não é mais um anti-herói a ser admirado, mas um sujeito que se debate com sua própria desconstrução, agora consumido pela idealização de sua persona. O conceito de “folie à deux”, a psicose compartilhada, é central para a dinâmica entre Fleck e Lee, mas a personagem de Gaga carece de profundidade, limitando a trama a um espelho da obsessão de Fleck. O maior acerto do filme está em sua estética visual; a fotografia de Lawrence Sher, impecável, e o design de produção de Mark Friedberg criam um universo denso e visualmente fascinante, onde a linha entre loucura e realidade é constantemente borrada. A iluminação, especialmente, é usada de forma magistral, com contrastes intensos entre a frieza do ambiente do Arkham e os momentos oníricos que representam os delírios de Fleck, oferecendo uma experiência sensorial única ao espectador.

No entanto, o filme carece de uma execução musical que corresponda à grandiosidade do conceito. Os números musicais, que deveriam evocar a mente fragmentada de Fleck, muitas vezes não se conectam totalmente com o tom da história, variando entre referências de cinema clássico, como os espetáculos em preto e branco dos anos 1940, e shows bregas de Las Vegas. A escolha de Phoenix para cantar durante as cenas adiciona uma camada de estranhamento à trama, pois sua voz tensa e forçada combina mais com sua caracterização de fleumático do que com uma performance fluida e emotiva. Em compensação, Gaga entrega uma performance cativante e visceral, mas seu papel como Lee, em grande parte moldado pela obsessão de Fleck, não alcança o potencial que poderia ter se ela fosse mais desenvolvida. Em muitos momentos, Lee parece mais um reflexo do protagonista do que uma personagem autônoma.

“Coringa: Delírio a Dois” se destaca por sua capacidade de ressignificar o primeiro filme. Ao retirar de Fleck o controle sobre sua narrativa e colocá-lo como objeto de escrutínio, Phillips oferece uma reinterpretação da violência e da exaltação da masculinidade tóxica, distorcendo o que antes poderia ser lido como uma glorificação do ressentimento masculino. Contudo, o roteiro, por vezes, peca pela excessiva didática, o que enfraquece a sutileza da mensagem que o filme tenta transmitir. A abordagem, embora inovadora e ousada, acaba por cair em um certo excesso de explicação, comprometendo a experiência de forma geral.

“Coringa: Delírio a Dois” é um filme de paradoxos. Ao mesmo tempo em que se distancia da estrutura do primeiro, ele também depende de sua existência para criar impacto. As sequências musicais são audaciosas e refletem a mente perturbada de Fleck, mas nem sempre justificam sua presença na narrativa. E, embora o filme tente se desviar da adoração de Fleck, ele se delicia ao colocá-lo novamente como centro das atenções. Com tudo isso, o que fica é um longa que, embora imperfeito, provoca uma reflexão profunda sobre as consequências de uma sociedade que transforma delírios em símbolos de revolução, ao mesmo tempo que lida com a fragilidade e a deterioração de um personagem que nunca deixou de ser humano, por mais distorcido que tenha se tornado.

Filme: Coringa: Delírio a Dois
Diretor: Todd Phillips
Ano: 2024
Gênero: Musical/Thriller
Avaliação: 7/10 1 1
★★★★★★★★★★