Em “Amarcord” (1973), Federico Fellini leva o espectador a um passeio por sua infância, deixando claro que sua intenção não é apenas contar uma história, mas fazer o público sonhar com ele. Ao explorar suas lembranças de um vilarejo de Rimini nos anos 1930, Fellini cria um ambiente onde o real e o imaginário se entrelaçam com leveza e magia, refletindo sobre a transição de uma vida de menino para a de homem. O filme mistura fantasia e realidade de maneira fluida, estabelecendo um contraste poderoso com “Roma” (1972), onde o cineasta adotou um tom mais rígido para abordar sua própria experiência de adulto.
Giuseppe Tornatore segue uma linha similar em “Cinema Paradiso”, mas com sua própria sensibilidade para retratar a paixão de um garoto pelo cinema. Junto com a corroteirista Vanna Paoli, Tornatore busca, tal como Fellini, explorar sentimentos universais através da história de Salvatore Di Vita, cujos devaneios de infância sobre o cinema se entrelaçam com a difícil realidade de sua vida adulta. Ambientado na Sicília após a Segunda Guerra Mundial, o filme narra a relação entre Totò e Alfredo, um projecionista que introduz o jovem ao encantamento do cinema, enquanto um padre tenta intervir nas cenas mais sensuais da tela grande. O vínculo entre o garoto e o projecionista transcende a simples admiração pela arte cinematográfica; é uma amizade baseada na partilha de emoções e na transformação que o cinema pode proporcionar. Ao longo de um flashback, vemos a jornada de Totò, desde sua inocência até a solidão do homem maduro, confrontando as limitações da arte frente à decadência e à morte.
Tornatore, como Fellini, faz suas próprias confissões sobre a arte do cinema e sua capacidade de provocar sentimentos intensos, mas também reconhece que ela não é capaz de curar todas as dores da vida. O filme é uma reflexão sobre as saudades e perdas que nos acompanham ao longo da vida, e a maneira como o cinema, enquanto forma de arte, oferece uma fuga temporária da dureza da realidade.
A história de Totò, interpretado por Salvatore Cascio, Marco Leonardi e Jacques Perrin, é, no fundo, a de todos que se apaixonaram pelas histórias contadas nas telas grandes, hoje reduzidas a pequenos dispositivos. Mas, ao contrário de um simples olhar nostálgico, o filme de Tornatore propõe uma meditação profunda sobre como a arte pode preencher lacunas emocionais, mas também nos lembrar das inevitáveis limitações da existência humana.
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