Você jamais iria imaginar, mas esse filme é um dos favoritos de todos os tempos de Martin Scorsese e está no Prime Video Divulgação / A24

Você jamais iria imaginar, mas esse filme é um dos favoritos de todos os tempos de Martin Scorsese e está no Prime Video

Mulheres solitárias e inquietas habitam tanto os relatos ficcionais quanto a realidade desde tempos imemoriais. No coração do Texas rural, uma jovem condicionada a passar seus dias entre a lida da fazenda e sonhos de estrelato colide com a dura percepção de que seu destino não reserva o brilho que almeja. Esse descompasso entre ambição e confinamento desencadeia uma espiral de desespero que conduz “Pearl” — uma obra que dosa horror, tragicomédia e elementos grotescos com a precisão de um mestre.

O filme, segundo capítulo da trilogia concebida por Ti West, sucedendo “X: A Marca da Morte” (2022) e antecedendo “MaXXXine” (2024), é um estudo de personagem que se debruça sobre a fragmentação psíquica e a ilusão de grandeza. A protagonista, enclausurada em uma existência opressora, enfrenta um labirinto de reflexos que deformam sua autoimagem até que a linha entre sanidade e delírio se dissolve por completo. O resultado é um espetáculo estético e narrativo que provoca fascínio e repulsa na mesma medida.

Uma das cenas iniciais estabelece o tom da obra com uma mistura de doçura infantil e brutalidade instintiva. Pearl, despertada à força pela mãe controladora, segue para o celeiro, onde, entre tarefas rotineiras, ensaia passos de dança para uma plateia improvável: os animais da fazenda. O devaneio dura pouco. Sem hesitação, ela atravessa um ganso com um forcado e leva o corpo inerte à sua fiel companheira, Theda — um jacaré batizado em homenagem à icônica Theda Bara (1885-1955). 

Enquanto a jovem alimenta sua fera, o mundo exterior caminha para o fim da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), mas sua realidade permanece imutável, envolta em repressão e frustrações caladas. A fotografia em Technicolor de Eliot Rockett intensifica esse contraste, traduzindo em imagens a aridez dos espíritos e a exuberância de um universo indiferente às dores humanas.

West orquestra a narrativa com sutileza e crescente tensão, deixando entrever os primeiros indícios da violência latente de Pearl. Um dos momentos mais impactantes do filme surge em sua interação com Mitsy (Emma Jenkins-Purro), cunhada e confidente involuntária, a quem confessa o vazio que sente ao lado do marido, Howard (Alistair Sewell). 

O peso dessa revelação não justifica suas ações, mas ilumina o abismo emocional no qual ela mergulha. Filha de Ruth, uma matriarca rígida e impiedosa interpretada por Tandi Wright, e de um pai inválido e silencioso vivido por Matthew Sunderland, Pearl descobre nesse ambiente árido um catalisador para sua metamorfose. O roteiro, assinado por West e Mia Goth, aprimora essa jornada, aprofundando a psicologia da protagonista no desfecho da trilogia.

Pearl é, antes de tudo, uma jovem consumida pelo desejo de escapar de sua insignificância. Mas seu desespero encontra uma saída que poucos poderiam prever. E ninguém deveria subestimar.

Filme: Pearl
Diretor: Ti West
Ano: 2022
Gênero: Terror/Violência
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★