Vender a alma em troca de um desejo parece tentador, mas poucos conseguem escapar do preço cobrado quando chega a hora de saldar a dívida. Entre os que ousam driblar o inevitável, há quem surpreenda até a astuta Morte, que, diante de negociações engenhosas, pode acabar cedendo ao jogo de sagacidade de seus interlocutores. Afinal, enquanto viver impõe limites, negociar com o fim abre espaço para reviravoltas inesperadas.
Em “Encontro Marcado”, Martin Brest mescla realismo fantástico com uma afiada reflexão sobre os caprichos do destino, transformado aqui em uma força passível de improvisos. Inspirando-se em “Uma Sombra que Passa” (1934), de Mitchell Leisen, Brest apresenta a Morte como uma figura tangível, que pisa no mundo dos vivos em busca de compreensão, apenas para se deparar com a rejeição universal que Manuel Bandeira, em seus versos, expressou tão bem. Nesse jogo entre o efêmero e o eterno, o diretor explora a relação dialética entre a humanidade e sua própria finitude, reforçada por um elenco de peso. Contudo, nem tudo se encaixa perfeitamente.
William Parrish, magnata do setor de comunicações, sofre um infarto que o aproxima do inevitável. Entre alucinações e sobriedades forçadas, ele percebe os sinais de algo sobrenatural, que culminam em sua grandiosa festa de 65 anos. No centro do enredo, o encontro casual entre sua filha Susan e um jovem misterioso sugere uma trama romântica, mas o desenrolar dos fatos revela algo bem mais sombrio: o rapaz, morto após o encontro inicial, ressurge como um visitante inusitado da festa, deixando claro que sua estadia no mundo dos vivos não será passageira.
Esse jovem, batizado de Joe Black por Parrish, é a personificação da Morte em busca de novos horizontes. Ele não apenas vem cumprir sua tarefa, mas se aventura pelos prazeres terrenos, questionando as emoções humanas e experimentando sensações banais, como o sabor de manteiga de amendoim. Nessa jornada, o envolvimento de Joe com Susan ganha destaque, embora careça da química necessária para convencer, especialmente se comparado à complexidade das tramas anteriores de Brest, como “Perfume de Mulher” (1992).
Paradoxalmente, Parrish parece mais vivo do que nunca, desafiando Joe Black e aproveitando a vida com intensidade renovada. Anthony Hopkins conduz seu personagem de forma magistral, evoluindo de um homem arrogante e distante para alguém que só busca mais tempo para valorizar o essencial. Apesar de suas três longas horas, o filme deixa uma reflexão pungente: o que realmente importa quando o tempo se torna um bem finito?
★★★★★★★★★★