Filmaço imperdível: Michael Douglas e Kim Basinger no suspense de ação mais eletrizante deste fim de semana na Netflix Doane Gregory / Twentieth Century Fox

Filmaço imperdível: Michael Douglas e Kim Basinger no suspense de ação mais eletrizante deste fim de semana na Netflix

Michael Douglas se apresenta com um rigor quase cerimonial em “Sentinela”, vestindo seu terno impecável e carregando a expressão de quem vive à beira de um abismo emocional. O longa, baseado na obra de Gerald Petievich, pretende lançar luz sobre o funcionamento interno da Casa Branca e as intrincadas engrenagens que mantêm o presidente dos Estados Unidos a salvo. Apesar de uma premissa que sugere mistério e tensão, o roteiro assinado por George Nolfi oscila entre passagens bem construídas e momentos em que as motivações dos personagens se dispersam, resultando em um enredo que às vezes parece tropeçar na própria ambição.

A narrativa gira em torno de rumores sobre a existência de um informante dentro do Serviço Secreto, alguém que estaria fornecendo dados confidenciais para facilitar um possível atentado contra o presidente. Garrison (Douglas), um agente veterano marcado por episódios traumáticos na proteção de políticos, se vê suspeito de traição quando pistas nebulosas apontam para seu envolvimento. A desconfiança se agrava graças ao vínculo íntimo que ele mantém com a primeira-dama, interpretada por Kim Basinger, cuja vulnerabilidade pessoal contrasta com sua posição oficial. Conforme a tensão aumenta, o filme lança a possibilidade de que cada corredor da Casa Branca possa abrigar um inimigo invisível ou uma armadilha à espreita.

O diretor Clark Johnson, conhecido pelo polêmico “S.W.A.T.”, apresenta um ritmo que remete ao cinema policial dos anos 1970: cenas de perseguição, confrontos de arma em punho e uma atmosfera de urgência constante compõem o cerne da ação. Em princípio, esse dinamismo satisfaz os aficionados por adrenalina, porém há quem critique a repetição do formato, que em dado momento deixa de transmitir a intensidade esperada. As trocas de tiros e explosões multiplicam-se sem oferecer um aprofundamento real na psique dos envolvidos, o que pode diminuir o impacto de cada cena potencialmente surpreendente.

Nesse redemoinho de desconfiança, Garrison é perseguido por antigos aliados, dentre eles o personagem interpretado por Kiefer Sutherland, um ex-amigo que agora lidera a caçada implacável contra o protagonista. O relacionamento entre os dois sugere ecos de Tommy Lee Jones e Harrison Ford em “O Fugitivo”, mas a própria condução do conflito não atinge a mesma densidade. Falta a sensação claustrofóbica que transformaria cada passo de Garrison em um desespero palpável, criando uma dúvida permanente sobre em quem se pode confiar ou de que lado a verdade está.

Kim Basinger assume o papel da primeira-dama, oscilando entre momentos de destaque e sequências em que a personagem se limita a um estereótipo estético. Embora seja uma atriz consolidada, ela recebe pouco material para explorar as nuances de alguém dividida entre a responsabilidade de representar a nação e os sentimentos que nutre por seu protetor. A química entre ela e Michael Douglas até se insinua em tela, mas o roteiro não se aprofunda o suficiente para que esse romance proibido ganhe força genuína. Já Eva Longoria, na pele de uma novata no Serviço Secreto, surge apenas como coadjuvante, oferecendo comentários pontuais e sem espaço para desenvolver um arco próprio.

Talvez a maior fragilidade de “Sentinela” resida na ausência de motivações convincentes para os antagonistas. Tudo indica uma conspiração de grande escala destinada a abalar os alicerces do poder presidencial, mas a trama não esclarece o que instiga tamanho ato terrorista. Como resultado, o espectador se depara com vilões cujas razões são vagas, o que reduz o peso dramático das cenas de confronto e deixa a sensação de que há um grande vazio no centro do conflito. Quando, enfim, a verdade sobre o traidor vem à tona, a revelação pouco surpreende, mais frustrando do que cativando.

É um paradoxo que nem o carisma de Douglas, habituado a papéis de homens pressionados até o limite, seja capaz de elevar a narrativa a um patamar memorável. Ele entrega momentos pontuais de dor e desespero, mas o roteiro não favorece camadas adicionais que poderiam lapidar esse agente experiente, muito menos reforçar a tensão existencial que tal função naturalmente sugere. Nolfi opta por estruturar o filme em reviravoltas sucessivas, sem investir na complexidade dos relacionamentos que sustentariam esse ritmo acelerado.

Alguns críticos traçam paralelos entre “Sentinela” e obras mais sólidas no gênero, como “O Plano Perfeito”, de Spike Lee, em que a conspiração se desenrola de maneira inteligente e as personalidades em jogo ficam claras ao público. A comparação evidencia a oportunidade perdida de explorar a dualidade entre lealdade e poder, elemento tão potencialmente rico quando se discute a proteção do presidente dos Estados Unidos. Em vez disso, a produção se concentra em coreografias de ação e num romance que permanece raso, deixando a sensação de que o cenário político real jamais recebe a profundidade que poderia torná-lo um diferencial digno de nota.

No desfecho, “Sentinela” transmite a impressão de uma ideia promissora, mas mal executada, que se apoia nas presenças marcantes de Michael Douglas e Kim Basinger para disfarçar sua falta de aprofundamento. Clark Johnson investe em sequências intensas e volumosas, enquanto o roteiro de Nolfi abre mão de construir uma tensão psicológica ou moral à altura do conceito inicial. Alguns espectadores se divertirão com as perseguições e o constante clima de urgência, mas sairão sem a impressão de terem vivenciado um suspense verdadeiramente arrebatador. Fica a frustração de notar como uma narrativa que envolve traição, poder e paranoia poderia ter sido mais incisiva, não fosse o excesso de barulho que, paradoxalmente, atenua a gravidade das ameaças. Em lugar de se instaurar uma tensão cortante, o filme culmina em uma experiência que se anuncia grandiosa, mas não encontra solidez para perdurar na memória do público.

Filme: Sentinela
Diretor: Clark Johnson
Ano: 2006
Gênero: Ação/Crime/Policial/Thriller
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★