Rodolphe Lauga constrói em “Ad Vitam” uma narrativa que flutua entre o drama denso e sequências de ação intensas, desafiando as convenções do gênero. No núcleo da história, Franck Lazareff, vivido com intensidade por Guillaume Canet, se vê em um redemoinho de acusações e violência: suspeito de homicídio, ele também lida com o sequestro de sua esposa, Leo. A trama se desdobra em camadas que alternam momentos eletrizantes e mergulhos no passado do protagonista, expondo os laços e conflitos que moldaram sua trajetória.
O longa se afasta da previsibilidade ao abandonar uma linha narrativa convencional. Lauga escolhe abrir a obra com cenas impactantes de ação que evocam referências de thrillers estrelados por ícones como Liam Neeson. Contudo, um extenso flashback logo redefine o ritmo, iluminando a complexa dinâmica entre Franck e Leo. Essa volta no tempo aprofunda o enredo e confere nuances aos personagens, transformando o filme em uma reflexão sobre relações humanas e lealdade. Quando a narrativa retorna ao presente, a mudança é abrupta, porém eficaz, mantendo a agilidade característica de uma produção compacta, com menos de 95 minutos.
Guillaume Canet entrega uma performance que alia a força de um ex-soldado a uma vulnerabilidade emocional, humanizando seu papel. Além de atuar, ele contribuiu para o roteiro, junto de Lauga e David Corona, criando um personagem que evita clichês de invencibilidade. Já Stéphane Caillard, como Leo, brilha ao encarnar uma mulher forte e autossuficiente. Suas cenas de ação reafirmam sua relevância, não como coadjuvante, mas como uma peça central em um universo predominantemente masculino. O contraste entre os flashbacks e os eventos atuais enriquece ainda mais a relação entre os dois protagonistas.
Embora tecnicamente bem acabado, o filme enfrenta dificuldades em equilibrar suas propostas distintas. O roteiro combina o tom sombrio de um drama policial francês com momentos de ação que flertam com o exagero, gerando um impacto visual e narrativo que nem sempre se harmoniza. A estrutura não-linear e o uso de locações turísticas, às vezes exploradas de forma superficial, acentuam essa falta de coesão. Em certos momentos, a produção parece hesitar entre a profundidade emocional e a busca pelo espetáculo.
A fotografia se destaca ao capturar cenários icônicos da França, oferecendo um ar grandioso, mas, em algumas passagens, os ambientes escolhidos soam artificiais, enfraquecendo a carga emocional. As cenas de ação, por mais eletrizantes que sejam, flertam com o irreal, o que pode desviar o público da essência dramática. Por outro lado, a química entre os personagens e a inclusão de uma crítica política sutil adicionam complexidade, ainda que essas reflexões não sejam totalmente exploradas.
No saldo final, “Ad Vitam” se apresenta como uma experiência intrigante e criativa. Apesar de escolhas narrativas e estilísticas que comprometem sua fluidez, o filme diverte e se arrisca ao desafiar expectativas. Não é uma produção revolucionária, mas sua coragem em misturar gêneros e oferecer algo fora do habitual merece reconhecimento. Uma obra que, mesmo com limitações, satisfaz e estimula quem busca histórias de ação com camadas de reflexão.
★★★★★★★★★★