“Sejam bem-vindos ao show, senhoras e senhores!” Apesar do impacto inicial garantido pelas tensas cenas de um assalto, só com essa frase do protagonista é que “Batman: O Cavaleiro das Trevas” (2008), de Christopher Nolan, ganha sua verdadeira força. No entanto, “Coringa: Delírio a Dois” não compartilha do mesmo destino. A proposta de Todd Phillips — explorar a complexidade de um dos antagonistas mais emblemáticos da cultura pop — soa promissora, mas o resultado decepciona. Nesta nova tentativa de desvendar o homem por trás da máscara e do sorriso forçado, o diretor acaba exagerando na abordagem, perdendo a essência que tornava o vilão fascinante. Críticas similares já recaíram sobre seu “Coringa” (2019), especialmente pelo polêmico desfecho. Desta vez, porém, nem mesmo a mais indulgente das perspectivas salva a pretensão vazia dessa versão, que se distancia do icônico personagem concebido por Bob Kane, Leslie H. Martinson e Bill Finger.
Ao longo do filme, o Coringa praticamente desaparece, cedendo lugar a Arthur Fleck, um homem fragilizado, aprisionado em Arkham como um criminoso comum. É nesse ambiente que a narrativa tenta revelar as camadas de sua mente conturbada, deixando de lado o charme sinistro do palhaço para focar em sua loucura banal. Phillips e o co-roteirista Scott Silver, ainda que com certo lirismo, enfatizam o estado mental do protagonista, mas o resultado carece de substância. O pouco do Coringa que resta surge nos raros momentos em que Fleck deixa sua fantasia musical e revisita o temperamento caótico que o define. Mesmo assim, o personagem só parece ganhar algum fôlego ao conhecer Lee Quinzel, durante aulas terapêuticas de canto, um fio condutor que soa mais como artifício do que aprofundamento.
Joaquin Phoenix, mestre na transformação, entrega uma performance competente, mas longe da reinvenção que marcou sua atuação em 2019. Seu Arthur Fleck não traz surpresas ou inovações que ampliem o alcance do personagem. Lady Gaga, por sua vez, falha em injetar vitalidade ao projeto, mesmo com a promessa de um musical. Seu desempenho, aquém de produções marcantes como “Nasce Uma Estrela” (2018), não atinge a força necessária para salvar a narrativa da monotonia. Em suma, “Coringa: Delírio a Dois” torna-se refém de suas próprias ambições, uma viagem ao surreal que confunde ousadia com desordem.
★★★★★★★★★★