O fim da juventude carrega significados distintos para cada pessoa: pode ser um triunfo conquistado a duras penas ou um peso difícil de suportar. Enfrentar os desafios implacáveis que a existência impõe desde cedo exige sacrifícios e renúncias que nem todos se dispõem a aceitar. Mas, em meio a tudo isso, há momentos em que viver se assemelha a um jogo imprevisível. Circunstâncias inesperadas, tanto as que se anunciam com sutileza quanto as que chegam como um impacto repentino, têm o poder de transformar vidas de maneira irremediável. Tragédias, perdas e eventos chocantes muitas vezes se revelam como um golpe silencioso ou uma tempestade abrupta, afetando até mesmo aqueles que tentam se manter firmes.
Nesse contexto, imaginar um grupo de amigos que transforma os escombros de um hospital em lar para escapar dos altos custos do aluguel pode parecer surreal. Essa é a premissa de “Crashing”, série que ainda ressoa como um marco memorável entre os espectadores. Criada por Phoebe Waller-Bridge, a comédia situa-se em seis episódios dirigidos por George Kane, revelando, além do humor, as lacunas emocionais e os desejos não ditos de cinco personagens, agravados pela entrada de uma figura inesperada que desafia suas dinâmicas.
Logo no início, a narrativa apresenta Kate e Anthony, interpretados por Louise Ford e Damien Molony, em meio a mais uma das muitas discussões que pontuam seu relacionamento. O cenário é completado por Sam, Melody e Fred, cujas histórias começam a se entrelaçar nesses primeiros 23 minutos. A chegada de Lulu, uma antiga conhecida de Anthony, desestabiliza o grupo, trazendo à tona os conflitos extraconjugais do casal, ao mesmo tempo que acentua outras tensões, como a luta de Sam contra sua própria identidade e seus sentimentos por Fred.
As cenas mais envolventes da série residem nessa delicada tensão emocional, com Jonathan Bailey interpretando Sam de forma complexa, oscilando entre misoginia e repressão interna, enquanto Amit Shah traz uma vulnerabilidade cativante ao papel de Fred. Esse contraste reforça as nuances emocionais da trama, mesmo quando o relacionamento de Kate e Anthony segue cansativo e previsível. Ainda assim, Louise Ford e Damien Molony conseguem insinuar camadas mais profundas nos conflitos de seus personagens. É o toque da criadora e atriz Phoebe Waller-Bridge, na pele de Lulu, que impede a narrativa de cair no melodrama, conduzindo-a para um desfecho que rompe com expectativas idealizadas, oferecendo uma conclusão tão racional quanto inesperada.
Série: Crashing
Criação: Phoebe Waller-Bridge
Ano: 2016
Gênero: Comédia
Nota: 8/10