A existência humana é um intrincado jogo de paradoxos, marcado por viradas inesperadas que nos forçam a encarar desafios sob a ótica de quem precisa lutar para sobreviver. Nessa batalha cotidiana, assumimos diferentes papéis em um vasto teatro existencial. Cercados por adversidades que se intensificam como uma cena dramática em constante evolução, surge em nós uma força quase primitiva — um instinto que nos protege, ainda que também revele a nossa própria fragilidade.
Essa força, alimentada pelo orgulho, pelo abandono e por feridas nunca cicatrizadas, molda reações que nem sempre controlamos. E, enquanto enfrentamos a dureza do mundo e nossos próprios dilemas, o desejo de alcançar um estado de paz interior torna-se quase utópico. Quando ilusões se desvanecem e neuroses se dissipam, um entendimento universal desponta, permitindo que as dores mais profundas sejam amenizadas pela onipresença da esperança, que nunca se limita ao horizonte final.
Contudo, até que esse ideal se concretize, o cotidiano se desintegra sob o peso das ambições humanas. A busca incessante por influência e controle é sustentada tanto pela passividade dos omissos quanto pela cumplicidade de hipócritas. Neste cenário, “The Cloverfield Paradox” se apresenta como uma narrativa que explora o eterno desencanto da humanidade com seu destino, utilizando o espaço como palco e a ficção científica como linguagem.
Julius Onah, diretor do terceiro capítulo da trilogia, constrói uma obra que ecoa inspirações cinematográficas de figuras como James Cameron, Andrei Tarkovski e Stanley Kubrick. O roteiro de Oren Uziel, embora não inovador em sua essência, aborda com vigor temas como a escassez de recursos naturais, o colapso social iminente e as disputas políticas globais. Entre reflexões sobre sobrevivência e confrontos éticos, despontam momentos que vão além do entretenimento, oferecendo camadas de complexidade e frescor.
A escolha de não conectar diretamente a trama aos filmes anteriores da franquia dá espaço para Ava Hamilton, interpretada pela brilhante Gugu Mbatha-Raw, assumir o protagonismo. Como cientista dedicada, ela busca refúgio no trabalho enquanto enfrenta a saudade do marido, o médico Michael, vivido por Roger Davies. No entanto, o convívio com uma tripulação diversa e multicultural em meio a uma crise revela desafios que vão muito além do isolamento emocional.
Volkov, o paranóico astronauta russo de Aksel Hennie, e Schmidt, o instigante personagem de Daniel Brühl, adicionam camadas de tensão e complexidade à narrativa. Brühl, em especial, entrega uma performance memorável, traduzindo com maestria a ambiguidade necessária para manter o suspense e o ritmo ágil que a história demanda. Com equilíbrio entre elementos de terror, drama e ficção científica, este capítulo reafirma a relevância do gênero ao dialogar com questões contemporâneas de forma intrigante e provocativa.
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