O universo de Gotham sempre se destacou pela riqueza narrativa e pelo contraste entre a decadência de seus becos sombrios e a elegância de seus personagens icônicos. Entre as criações da DC, a saga de Batman é singular, não apenas pelos heróis e vilões que habitam suas tramas, mas pela atmosfera noir que captura a essência de uma cidade inspirada na Nova York das décadas de 1970 e 1980. Nesse cenário marcado por crime e corrupção, Gotham não é apenas um pano de fundo, mas um personagem vivo que influencia cada decisão e conflito.
“Pinguim”, a nova série de Lauren LeFranc, mergulha nesse universo ao explorar a ascensão de Oswald Cobblepot, interpretado magistralmente por Colin Farrell. Aqui, acompanhamos um Oz ainda longe de se tornar o informante e vilão consagrado dos filmes, mas já consolidado como um gangster astuto e ambicioso. A transformação de Farrell em Cobblepot é um feito à parte: com a ajuda da genialidade do maquiador Mike Marino, ele se torna irreconhecível, dando vida a um personagem que é tanto brutal quanto fascinante.
Oswald cresceu em um subúrbio devastado pelas enchentes vistas em “The Batman” (2022), de Matt Reeves. Com uma determinação feroz, ele ascendeu nas fileiras da máfia italiana, tornando-se um estrategista eficaz e líder de uma equipe de operações perigosas. Embora demonstre lealdade à Família Falcone, liderada por Carmine Falcone, sua verdadeira natureza é movida pela ambição. Esse traço é simbolizado pelo uso recorrente do roxo — um elemento presente em seus ternos sob medida, no luxuoso carro que dirige e em outros detalhes que ressaltam sua ascensão social.
A narrativa ganha intensidade após a morte de Carmine, quando Oz, em um ato impulsivo, mata Alberto Falcone (Michael Zegen) durante uma discussão que foge ao controle. Este momento de tensão se torna o catalisador para os eventos subsequentes, levando-o a arquitetar um plano para incriminar a família rival, os Maroni. Para isso, ele recruta Victor Aguilar (Rhenzy Feliz), um jovem ladrão de carros que, após cruzar acidentalmente o caminho de Oz, é coagido a colaborar. Apesar de inicialmente relutante, Victor compartilha com Oz um passado de pobreza e tragédias familiares — ambos cresceram no mesmo bairro e enfrentaram perdas dolorosas. Essa conexão evolui de uma relação baseada no medo para algo mais complexo, marcado por lealdade e cumplicidade.
No entanto, os desafios de Oz não param por aí. A chegada de Sofia Falcone (Cristin Milioti), nova líder da família, adiciona outra camada de complexidade à trama. Sofia é uma figura tanto imponente quanto vingativa, desconfiando que Oz tenha desempenhado um papel em sua prisão e na década que passou em Arkham. A dinâmica entre os dois é carregada de tensão, com cada movimento testando os limites da paciência e da astúcia.
Paralelamente, a série revela as camadas mais pessoais de Oswald Cobblepot. Sua relação com a mãe, Francis (Deirdre O’Connell), é um elemento central, explorando a bagagem emocional de um homem marcado pelo abandono paterno e pela perda trágica de seus dois irmãos na infância. Esses traumas moldaram sua personalidade e alimentam sua busca incessante por poder e respeito. Essa abordagem humaniza Oz, transformando-o em um personagem que transita entre o vilão e o anti-herói, refletindo a complexidade moral que define Gotham.
A produção de “Pinguim” é um triunfo em todos os aspectos. A direção de arte captura com perfeição o clima opressivo e decadente de Gotham, enquanto o roteiro combina intriga, drama e momentos de introspecção. As atuações são um destaque à parte, com Colin Farrell entregando uma performance que mescla intensidade e vulnerabilidade de forma magistral. Mais do que uma exploração do submundo do crime, a série é um estudo profundo de personagem, oferecendo um mergulho fascinante na mente de um dos maiores nomes do panteão de vilões da DC.
Com sua narrativa rica em detalhes e uma execução impecável, “Pinguim” não apenas honra o legado de Gotham, mas redefine as expectativas para produções do gênero. A série não é apenas um complemento ao universo de Batman; é uma obra que se sustenta por méritos próprios, cativando o público com uma história tão sombria quanto irresistível.
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