Com um orçamento arrojado de 50 milhões de dólares, “Guerra Civil”, dirigido por Alex Garland, inaugura a entrada da A24 no universo dos blockbusters. Diferente das produções convencionais do estúdio, conhecidas pelo tom intimista, este filme expande as fronteiras ao explorar uma narrativa distópica que transcende as questões políticas. Garland utiliza a fragmentação dos Estados Unidos como pano de fundo para uma análise profunda sobre a ética jornalística em tempos de colapso social, questionando o papel da imprensa diante do caos e do descredito.
Ambientado em um futuro sombrio, o filme retrata um país dilacerado por uma guerra civil. A Frente Ocidental avança sobre Washington, D.C., em uma tentativa de derrubar o governo. Nas áreas urbanas, reina a anarquia, enquanto as zonas rurais se apegam à ilusão de normalidade. Nesse cenário devastador, um grupo de jornalistas se arrisca para desvendar os eventos que alimentam o conflito, enfrentando a crescente hostilidade que os coloca como alvos. A essência do filme está na busca pela verdade, destacando o compromisso inabalável de reportar os fatos, mesmo sob risco de vida.
Kirsten Dunst assume o papel de Lee Smith, uma fotojornalista experiente marcada pelo trauma das violências que registrou ao longo da carreira. Ao seu lado, Wagner Moura interpreta Joel, um repórter sul-americano cuja nacionalidade permanece ambígua, mas cuja determinação é clara: conquistar a primeira entrevista com o presidente dos EUA em mais de um ano. Eles compõem uma equipe da Reuters que inclui Sammy (Stephen McKinley Henderson), veterano do “The New York Times”, e Jessie (Cailee Spaeny), uma jovem fotojornalista inspirada pela resiliência de Lee. Juntos, eles adentram zonas de combate onde ser jornalista é sinônimo de inimigo.
O filme não se limita a cenas de tensão; ele explora com profundidade as relações humanas em situações extremas. Em um momento de grande intensidade, Jesse Plemons interpreta um soldado cujo alinhamento é incerto. Durante um interrogatório brutal, ele ridiculariza Joel ao sugerir que sua origem é da “América Central”, para em seguida executar dois jornalistas asiáticos. Essa cena revela não apenas a violência do conflito, mas também os preconceitos que inflamam a desumanização. Garland constrói aqui um paralelo contundente com questões atuais, expondo as camadas de intolerância que permeiam a sociedade.
Visualmente, “Guerra Civil” é um tributo aos grandes clássicos de guerra, como “Apocalypse Now” e “Nascido para Matar”, ao mesmo tempo em que dialoga com a contemporaneidade de “Guerra ao Terror”. A cinematografia é visceral, imersiva e carregada de simbolismos, transportando o espectador para o coração do conflito. Contudo, o filme também se posiciona como uma ode ao jornalismo de campo, celebrando a coragem daqueles que arriscam tudo em nome da verdade. Para Garland, cujo histórico familiar inclui vínculos com o jornalismo, e Wagner Moura, formado na área antes de se tornar ator, esta obra é também um testemunho pessoal.
Garland entrega uma narrativa que vai além do entretenimento. “Guerra Civil” é uma reflexão profunda sobre o papel transformador da imprensa em cenários de crise, convidando o público a ponderar sobre o preço da verdade. O filme desafia o espectador a considerar o que significa ser jornalista em um mundo onde contar a história pode custar a própria vida.
★★★★★★★★★★