Nada pode ser mais clichê para um casal que enfrenta momentos difíceis na relação que saírem os dois, como os jovens apaixonados e inconsequentes que decerto foram um dia, meio sem rumo, à cata de um pretexto para tentar impedir o que já não vai bem de se esfacelar de vez. Relações são quase sempre pautadas por crises, e não é incomum encontrar homens e mulheres que digam serem adeptos de um súbito gelo a fim de que a chama do amor arda outra vez, com mais força.
Em “A Garota Francesa”, um professor do ensino fundamental de Nova York e uma chef de cozinha franco-canadense parecem viver numa constante lua de mel, mas, como sói acontecer, são surpreendidos por uma trapaça do destino, uma trapaça morena, de carnudos lábios pintados de vermelho e um prestigiado programa de culinária na televisão. James A. Woods e Nicolas Wright apostam numa sátira que perde a força à medida que vão se esgotando as situações e os diretores-roteiristas precisam incluir no leito da trama uma pletora de novos personagens, mais tumultuando que divertindo.
Como todos os sentimentos de que o homem desfruta e contra os quais flagra-se numa guerra cruenta, tentando se libertar e cada vez mais enredando-se em seus fios, igual à mosca na teia da aranha, o amor tem predicados e defeitos de que se gosta ou se desgosta em maior ou menor proporção, despertando assim reações as mais imprevisíveis a depender de quem atinja. Na sequência de abertura, Gordon Kinski e Sophie-Jeanne Tremblay, os personagens de Zach Braff e Evelyne Brochu, dividem momentos idílicos. Enquanto ela ainda dorme, ele queima brioches e faz uma lambança tentando preparar ovos beneditinos para a amada, que se levanta, pega uma cesta de palha e vai à feira, a própria visão da felicidade simples.
O arco da história vira rapidamente para Ruby Collins, a dona do Frontenac, um badalado restaurante de Quebec, que parece ter um fetiche qualquer por jogos de sedução e reúne numa disputa por trabalho seus três últimos parceiros, entre os quais Sophie. Começa o calvário de Gordon, obrigado a licenciar-se de suas aulas de literatura inglesa, nas quais se veste como o próprio Shakespeare, para acompanhar Sophie ao Canadá, obrigado também a engolir a família nada convencional da moça.
Vanessa Hudgens acrescentaria algum espírito a essa farsa pseudo-romântica, não fosse o artificialismo que se instala depois de admitido no enredo o núcleo dos Tremblay, bárbaros que enfrentam-se clandestinamente num octógono e acabam por contaminar até mesmo a sensibilidade de Gordon. A megalomania de Woods e Wright, que inclui ainda uma avó com demência que teima em não deixar que o professor recupere a aliança de família que pretende oferecer a Sophie, torna “A Garota Francesa” (que é, na verdade, franco-canadense, não nos esqueçamos) um espetáculo um tanto mais melancólico em seu tom apelativo e pouco convincente. Je suis désolé.
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