A força do cinema está em sua capacidade de condensar longos períodos em experiências intensas e significativas, e Richard Linklater explora isso de forma magistral ao seguir a trajetória de um garoto de seis anos até sua entrada na vida adulta. Em pouco menos de três horas, uma década se desenrola, fruto de uma jornada audaciosa de 12 anos de filmagens e um orçamento modesto de US$ 4 milhões, que gerou um retorno quinze vezes maior. Linklater, conhecido por brincar com o conceito do tempo em obras como a trilogia iniciada com “Antes do Amanhecer” (1995), reforça aqui seu interesse em capturar a efemeridade da vida e transformá-la em arte. Seu compromisso em explorar a passagem dos anos como matéria-prima artística confere à obra um peso único e relevante no cenário audiovisual.
Ellar Coltrane, o coração pulsante dessa história, abraçou o desafio de dedicar um mês por ano ao projeto, compreendendo desde cedo o impacto que essa escolha teria em sua vida. Ele encarou sacrifícios típicos de uma longa odisseia: deixou brincadeiras, perdeu horas de sono e até mesmo precisou faltar à escola. Contudo, ao amadurecer junto à narrativa, Coltrane percebeu o valor imensurável da experiência, que moldaria tanto seu caráter quanto sua carreira. Sua jornada lembra as epopeias de figuras clássicas como Ulisses, oferecendo um paralelo entre a ficção de Homero e as implicações práticas de um projeto cinematográfico tão ambicioso.
Embora inovador em sua abordagem, o filme não aborda temas inéditos. Conflitos familiares, divórcios e os desafios da juventude já foram tratados por autores e diretores consagrados, como Ingmar Bergman em “Cenas de um Casamento” (1974) e Liev Tolstói em “Anna Kariênina” (1877). Contudo, o diferencial de Linklater está em transformar situações cotidianas em arte que transcende o ordinário. Ele captura a essência da vida com uma delicadeza que apenas o cinema pode proporcionar, elevando temas banais a um nível quase filosófico, onde a reflexão sobre o tempo e as relações humanas se torna inevitável.
A narrativa progride sem alardes sobre a passagem do tempo, e essa escolha contribui para a autenticidade do enredo. A presença de Ethan Hawke e Patricia Arquette, que encara o envelhecimento com coragem e profundidade, oferece uma dimensão visceral à trama. A performance de Arquette, premiada com o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante, adiciona camadas de humanidade ao filme. Já Coltrane personifica a transição da infância para uma juventude cheia de incertezas e descobertas, entregando um testemunho poderoso sobre o amadurecimento.
Apesar de sua longa duração, a obra recompensa a paciência do espectador com uma narrativa repleta de referências culturais e uma trilha sonora cuidadosamente escolhida. Esse túnel do tempo, guiado pelo olhar sensível de Linklater, proporciona uma experiência incomparável. O filme nos lembra que, embora o tempo seja implacável, o que realmente importa é o que perdura em nossas memórias e histórias. Através de um mosaico emocional e visual, somos convidados a refletir sobre os momentos que nos definem e como eles ecoam na eternidade.
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