A incursão de Grant Singer no universo da ficção cinematográfica, após dirigir videoclipes de grandes nomes como The Weeknd, Skrillex e Sam Smith, revela a maturidade artística adquirida ao longo de sua trajetória. “Camaleões”, sua estreia no gênero, é um thriller que flerta com a ambição, mas nem sempre evita os tropeços do previsível. Ainda assim, o controle minucioso sobre o elenco — extraindo atuações consistentes e nuançadas — é o que eleva a obra acima de muitos suspenses de cineastas iniciantes.
Conforme a trama se desdobra, emerge o esforço de Singer em desafiar convenções narrativas, mesmo que os resultados oscilem. Embora falhe em manter a originalidade de maneira constante, o filme consegue instigar e engajar, mantendo o público intrigado até seu desfecho deliberadamente farsesco. É uma obra que sugere mais do que entrega, mas cuja execução estilística compensa eventuais lacunas de conteúdo.
No cerne da história, está a jornada de Will Grady, interpretado com habilidade por Justin Timberlake. Grady é apresentado como um empresário bem-sucedido e aparentemente intocado pelas adversidades da vida. Timberlake imprime ao personagem uma dualidade sutil: sua fachada de “bom moço” aos poucos cede lugar a um homem envolto em ambiguidade moral. O cotidiano de Grady ganha um ponto de virada brutal quando ele descobre o corpo de sua namorada, Summer Elswick (vivida por Matilda Lutz), vítima de um assassinato brutal. Esse evento desencadeia uma espiral de suspeitas, transformando-o no principal foco da investigação liderada pelo detetive Tom Nichols, papel assumido com maestria por Benicio Del Toro.
Del Toro traz uma profundidade inquietante a Nichols, um homem marcado por obsessões que ultrapassam o profissional, refletidas em olhares cansados e olheiras que parecem guardar histórias não contadas. Sua dinâmica com Dan Cleary, vivido por Ato Essandoh, adiciona uma tensão contrastante à narrativa, enquanto a relação conturbada de Nichols com sua esposa, Judy (Alicia Silverstone), oferece um raro respiro emocional em meio ao peso sufocante da trama.
Singer constrói a tensão com precisão, equilibrando momentos de introspecção com reviravoltas que testam os limites do público. A narrativa, coescrita por Singer, Benjamin Brewer e Benicio Del Toro, aborda o conceito de redenção masculina a partir de uma perspectiva inusitada: a necessidade de recomeçar em meio ao caos. Essa ideia se cristaliza no segundo ato, quando Nichols assume o protagonismo moral da história, direcionando os acontecimentos com sua presença imponente.
“Camaleões” não é apenas sobre resolver um crime; é um mergulho nas complexidades humanas, explorando ego, culpa e vulnerabilidade. Embora o filme nem sempre escape de sua própria ambição, ele marca a estreia de Singer com um impacto inegável, posicionando-o como um diretor a ser observado no futuro.
★★★★★★★★★★