Os grandes feitos da humanidade, muitas vezes, foram alcançados por meio de conflitos armados, resultando na queda de tiranias que impunham sua vontade ao mundo. Essas batalhas, embora devastadoras, também serviram para desmantelar regimes autoritários que oprimiam etnias inteiras sob o olhar omisso da comunidade global. Em um retrato intenso da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), “O Resgate do Soldado Ryan” parte de um episódio aparentemente secundário, mas que, no desenrolar da narrativa, revela conexões profundas com a grandiosidade do conflito.
O enfrentamento da guerra, como nos alertou Winston Churchill, nem sempre é escolha fácil, mas frequentemente é a única alternativa para preservar a dignidade de um povo. Conceitos como honra, coragem e lealdade, vitais no campo de batalha, são explorados com maestria por Steven Spielberg, que, ao longo de sua carreira, tem desafiado a visão do homem sobre si mesmo, especialmente em relação à turbulenta história do último século.
A trama, assinada por Robert Rodat, ecoa a busca humana por sentido em meio ao caos, com o título evocando ideias de retorno, redenção e transformação. O personagem Ryan, que ganha contornos quase mitológicos, funciona como uma metáfora poderosa das incertezas e do potencial de superação humana. Matt Damon interpreta Ryan de forma simbólica, permanecendo boa parte do filme como uma figura projetada entre idolatria, compaixão e, por vezes, desprezo, pelos soldados que enfrentam a brutalidade em Omaha Beach, uma das praias cruciais no Dia D. Este microcosmo revela tanto a crueza quanto a nobreza de um conflito que marcou a história.
Inspirado pelo sargento Frederick William “Fritz” Niland, Ryan simboliza os milhares de jovens que pereceram ou foram marcados pela guerra. Spielberg utiliza esse gancho histórico para desmistificar a guerra, revelando suas nuances humanas. Sob a liderança do capitão John H. Miller, interpretado por Tom Hanks, um pelotão é destacado para resgatar Ryan, enfrentando cenários que oscilam entre o heroísmo e o desespero. A batalha contra as Maschinengewehr 42 destaca o impacto psicológico e moral do conflito, evocando produções como “Apocalypse Now” e “Falcão Negro em Perigo”, enquanto a cinematografia de Janusz Kaminski confere ao filme uma sensação documental e visceral. Os detalhes, cuidadosamente desenhados, reforçam a assinatura de Spielberg, contribuindo para os prêmios de Melhor Fotografia e Direção no Oscar.
A chegada tardia a este filme foi marcada por uma reconciliação com Spielberg, cujo trabalho me encantou em “E.T.” e “Jurassic Park”, mas me afastou com os excessos de “Indiana Jones”. “O Resgate do Soldado Ryan” transcende qualquer desconfiança anterior, revelando-se um épico que homenageia os sacrifícios humanos. O desempenho impecável de Tom Hanks eleva o filme, transformando-o em uma celebração sombria e grandiosa dos valores que resistem em tempos de guerra. Spielberg, com sua visão inovadora, ressignifica o gênero, oferecendo uma obra-prima que permanecerá como referência na arte de contar histórias.
★★★★★★★★★★