Espionagem, como tema, nunca passa despercebida. Há algo irresistível em tramas que misturam realidade e ficção, despertando curiosidade sobre o quanto é verdade ou fruto da imaginação. No caso de Ashraf Marwan (1944-2007), um nome intrigante no serviço secreto israelense, a transição de um empresário egípcio a espião levanta questões que desafiam explicações simples. Em “O Anjo do Mossad”, Ariel Vromen conduz o espectador por um labirinto de possibilidades, questionando a moralidade, as escolhas e os mistérios que cercam esse personagem. Sua abordagem transita entre detalhes históricos e questões humanas, equilibrando o fascínio pelos bastidores com a complexidade emocional de Marwan. A curiosidade natural do público, amplificada pelo lançamento do filme, confirma o poder dessas histórias em manter viva a discussão, seja em tom de crítica ou exaltação.
O diretor destaca a ambiguidade de Marwan, vivido por Marwan Kenzari, um homem que enfrentava figuras do próprio círculo familiar, como o sogro e presidente egípcio Gamal Abdel Nasser (1918-1970). O relacionamento com Nasser e seu sucessor, Anwar Al Sadat (1918-1981), forma o núcleo de um drama político e pessoal. Marwan, embora bem-sucedido, desafia as expectativas ao se alinhar ao inimigo histórico de sua nação.
Vromen não entrega respostas definitivas sobre sua motivação: seria desilusão, medo ou um jogo estratégico para remediar relações familiares tensas? O roteiro de David Arata explora tais dilemas com profundidade, retratando um protagonista dividido entre emoções conturbadas e decisões que selaram seu destino. Apesar de lacunas, o filme oferece um retrato instigante de um homem cuja trajetória desconcertante continua a intrigar e desafiar interpretações definitivas.
Vromen, ao trazer à tona as fragilidades de Marwan, cria um estudo de personagem denso, entremeado pelo contexto político de um Oriente Médio em ebulição. A tensão entre EUA e União Soviética, a postura de Sadat em contraste com Nasser e as incertezas do período formam o pano de fundo. Waleed Zuaiter e Sasson Gabai interpretam com competência os líderes egípcios, enquanto Maisa Abd Elhadi adiciona nuances ao papel de Mona, esposa de Marwan.
O ponto alto, porém, é Kenzari, cuja performance habilidosa captura a essência de um homem em conflito. Londres e Cairo ganham vida como cenários de uma narrativa que mescla intimidade e intriga global. O desfecho, marcado por uma morte envolta em mistério, encerra a história com o peso de sua ambiguidade. O filme, ao desvendar partes dessa vida complexa, deixa ao público a tarefa de juntar peças, provocando reflexão sobre o poder, as lealdades e as sombras que habitam histórias reais.
★★★★★★★★★★