Até onde pode ir uma franquia? “Godzilla”, a série de ficção científica inaugurada por Ishirō Honda (1911-1993) em 1954 segue com força, capitaneada por um organismo colossal, impiedoso, cheio de vontades e assumidamente grotesco, que deixa o oceano Pacífico para atormentar um batalhão de soldados pouco antes do fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Não se veem muitas diferenças entre “King Kong vs. Godzilla” (1962), dirigido pelo próprio Honda, e este “Godzilla e Kong: O Novo Império”, a não ser, claro, as invenciones tecnológicas de que Adam Wingard lança mão para capturar a atenção das plateias de hoje.
Produto dos 37 filmes anteriores protagonizados pelo lagarto titânico, esse kaiju dos mais aclamados pela cultura pop, “O Novo Império” é uma boa tentativa de Wingard quanto a abordar temas atuais mantendo o personagem em evidência, ainda que perceba-se aqui e ali o andamento farsesco da história. O pretensioso roteiro, coassinado pelo diretor, Simon Barrett e Terry Rossio, puxa a sardinha para o escamoso, mas não deixa de contemplar a outra criatura monstruosa do título, igualmente assustadora e tão limitada por clichês.
Godzilla já esteve sob a mira do alferes Koichi Shikishima, um ex-kamikaze que volta ileso da guerra, e, uma vez mais, ele perde a chance de se tornar o salvador que a nação espera que seja. Em “Godzilla Minus One” (2023), Takashi Yamazaki dota Big G da cólera bestial que o leva a aniquilar todo um grupamento de soldados, e um ano depois, em 1946, num país em escombros, o público vai notando que o monstrengo subjuga exércitos graças à tibieza moral dos homens.
Agora, quem chega para colocar um pouco mais de lenha na fogueira é King Kong — ele, inclusive, é quem abre o prólogo, movendo-se por pradarias sem fim ao passo que se esforça para escapar da ofensiva de bichos que lembram imensos lobos, sobre os quais leva a melhor arrancando nacos de que escorre um líquido verde —, até que Wingard comece a situar o público acerca de um certo Projeto Monarca, elaborado pela antropóloga Ilene Andrews visando a detectar novas ameaças. Rebecca Hall é de longe a melhor coisa nesta nova sequência de “Godzilla”; Hall consegue desfilar por todos os muitos núcleos, um mais heterogêneo que o outro, ao passo que desenvolve a contento a subtrama mais relevante do enredo, a relação entre Ilene e a filha adotiva Jia, de Kaylee Hottle. Na iminência do desfecho, brasileiros somos “homenageados” com tomadas de computação gráfica no Rio, onde Godzilla e Kong se batem em meio às ondas furiosas de Ipanema. Pobre Honda.
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