Com um orçamento enxuto de 11 milhões de dólares, “A Vingança Está na Moda” destaca-se como um drama australiano singular que alia ousadia narrativa à inventividade visual. Sob a direção de Jocelyn Moorhouse, o projeto encontrou sustentação na presença magnética de Kate Winslet, cuja adesão foi decisiva para a viabilização do filme. Moorhouse, ciente do peso de uma estrela de renome, aguardou pacientemente por Winslet, mesmo durante sua gravidez e puerpério, um ato que refletiu a confiança na capacidade transformadora da atriz. Winslet, por sua vez, não apenas aceitou reduzir seu cachê habitual, mas trouxe à obra uma sofisticação que eleva a narrativa a um patamar inegavelmente especial.
Baseado no romance de Rosalie Ham, o filme adapta a obra com notável fidelidade, equilibrando-se entre o drama e a comédia sombria. Winslet encarna Tilly Dunnage, uma costureira de talento excepcional que retorna à remota cidade de Dungatar, onde o passado não apenas ecoa, mas molda as relações e conflitos locais. Carregando o peso de memórias fragmentadas e a suspeita de envolvimento na morte de Stewart Pettyman, Tilly enfrenta o julgamento implacável de uma comunidade dominada pelo preconceito e pelas fofocas.
Dungatar emerge como um cenário tão expressivo quanto seus habitantes. Suas paisagens ressecadas e o clima opressor evocam uma atmosfera de Velho Oeste, onde as regras sociais são ditadas por olhares e cochichos. Nesse contexto, Tilly, com sua elegância parisiense e criações de alta costura, é um elemento disruptivo que atrai tanto admiração quanto inveja. Apesar da resistência inicial, as mulheres da cidade são seduzidas por suas roupas impecáveis, numa tentativa de fugir à monotonia que permeia suas vidas.
Enquanto tenta reconstruir o quebra-cabeças de seu passado, Tilly encontra apoio em Teddy McSwiney (Liam Hemsworth), um homem que personifica liberdade e empatia em meio à rigidez moral de Dungatar. A relação entre os dois, repleta de humor e ternura, contrasta com a hostilidade da comunidade, oferecendo momentos de leveza à trama. Paralelamente, a complexa dinâmica entre Tilly e sua mãe, Molly (Judy Davis), confere camadas emocionais ao enredo. Inicialmente marcada pelo distanciamento, essa relação se transforma gradualmente, revelando o impacto do isolamento e do estigma na vida das mulheres. As interações entre Winslet e Davis são um ponto alto, traduzindo com profundidade as feridas e reconciliações que moldam as personagens.
O ponto de culminância do filme é atingido quando segredos enterrados vêm à tona, expondo a hipocrisia enraizada na pequena cidade. Embora a narrativa apresente momentos de lentidão, estes são compensados por reviravoltas que mantêm o espectador intrigado até o último ato. Visualmente, o filme é um deleite: os figurinos exuberantes não apenas refletem a sofisticação de Tilly, mas também funcionam como um contraponto à aspereza do cenário. A cinematografia de Don McAlpine captura com precisão a aridez de Dungatar, criando um contraste entre a beleza estilizada dos trajes e a brutalidade das paisagens.
Disponível na Netflix, “A Vingança Está na Moda” não apenas se beneficia de seu elenco estelar — que inclui nomes como Hugo Weaving e Sarah Snook —, mas também de uma direção que explora com habilidade os absurdos e as tragédias do cotidiano. Ao desafiar convenções e propor uma reflexão sobre memória, justiça e redenção, o filme consolida seu lugar como uma experiência cinematográfica impactante. Mesmo com suas imperfeições, a narrativa cativa ao desvelar a complexidade das relações humanas, oferecendo ao público uma história que é, ao mesmo tempo, comovente e inesquecível.
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