Um dos filmes mais assistidos da atualidade: a guerra contra a IA que você vai querer assistir duas vezes, no Prime Video Divulgação / Hulu

Um dos filmes mais assistidos da atualidade: a guerra contra a IA que você vai querer assistir duas vezes, no Prime Video

Chega um momento na vida em que, se tínhamos alguma ilusão quanto a ser capaz de dar cabo dos problemas do mundo, essa quimera de onipotência é soterrada pela inescapável verdade que nos lança ao rosto que arrumar nosso próprio quarto já é exaustivo o bastante. A despeito do que possamos querer, o tempo, senhor da razão e tudo quanto há de inexplicável no mundo, avança sem trégua, não para nunca, não admite ser desapontado e, caprichoso, tem suas próprias vontades e seus planos para o homem. Tentar prever até onde pode chegar a inteligência artificial e todas as falsas urgências de que a imbuímos torna-se um desafio hercúleo e uma riquíssima fonte de enredos para o cinema.

De quando em quando, esses vaticínios são reforçados por produções como “O Criador”, uma distopia aparentemente séria, mas vazia em seus esforços de despertar a atenção do público recorrendo a uma verdadeira antologia de ficções científicas de sucesso. Diretor de arrasa-quarteirões de franquias que dobram o passar dos anos, Gareth Edwards pega o espectador pelo olhar, a exemplo do que se assiste em “Godzilla” (2014) e “Rogue One: Uma História Star Wars” (2016), e parece certo de que isso é o suficiente. À medida que a história toma corpo, nota-se que o truque não surte o efeito que prometia.

O roteiro de Gareth e Chris Weitz abusa de pirotecnias estéticas para convencer a audiência de que o futuro tem muitas caras, mas todas elas podem ser resumidas por Alphie, uma menina de nove anos, espantosamente madura para sua tenra idade, na qual estão concentradas as poucas chances de redenção da humanidade. Ainda que o carisma magnético de Madeleine Yuna Voyles garanta momentos de emoção genuína, não tardam a pulular associações com John Connor, o candidato a messias de “O Exterminador do Futuro” (1984), o clássico pré-apocalíptico de James Cameron, e então tem início uma batalha quanto a asseverar que o filme tem identidade própria.

Na introdução, o narrador conta que máquinas pensantes viraram empregados domésticos, astronautas e boxeadores, “poupando” gente de carne e osso e libertando-a para ganhar a vida com atividades mais serenas e quiçá idílicas. Não é o que ocorre, por óbvio, e em 2065, Los Angeles sofre um ataque nuclear deflagrado por robôs em que morrem meio milhão de seres humanos, entre os quais a família de Joshua, que se muda para um lugar chamado Nova Ásia, uma reconfiguração do Oriente que lembra o Camboja ou o Vietnã. Joshua perdera o braço direito numa das explosões e ele mesmo parece um híbrido, emboraseu casamento com Maya deixe claro que sua porção homo sapiens prevalece.

Quinze anos se passam e a paz de Joshua e Maya é interrompida brutalmente com a invasão da NOMAD, uma força plurinacional que visa a erradicação dos autômatos. O Criador do título, uma figura misteriosa e sem nenhum parâmetro ético, coordena a NOMAD e exige que Joshua participe da ofensiva do exército americano contra a inteligência artificial, sem dúvida a melhor coisa aqui. A coronel Howell de Allison Janney lidera a tropa, ao passo que Joshua experimenta novas perdas, e John David Washington equilibra-se bem entre o cálculo e o desespero, já visíveis nas cenas com Gemma Chan — o que também fizera em “Tenet” (2020), de Christopher Nolan. Ou seja, muito barulho por quase nada.

Filme: O Criador 
Diretor: Gareth Edwards 
Ano: 2023
Gênero: Ação/Ficção Científica/Suspense
Avaliaçao: 7/10 1 1
★★★★★★★★★★
Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.