“Bastardos Inglórios” se destaca não apenas como um marco na carreira de Quentin Tarantino, mas como um dos momentos mais marcantes do cinema contemporâneo. Dividido em capítulos, o filme inicia com uma cena emblemática liderada por Christoph Waltz, no papel do coronel nazista Hans Landa. Conhecido como o “Caçador de Judeus”, Landa visita a casa do fazendeiro francês Perrier LaPadite, em busca de judeus escondidos. Após um diálogo tenso, ele ordena que seus soldados disparem contra o chão, eliminando uma família escondida. Entretanto, a jovem Shoshana foge. Observando sua silhueta desaparecer, Landa deixa escapar um sarcástico “Au Revoir, Shoshana!”.
O projeto de Tarantino, que precedeu “Kill Bill” em termos de concepção, teve um longo processo de desenvolvimento. Escolher o elenco ideal foi um dos maiores desafios, especialmente para o papel de Landa. Embora Tarantino tenha cogitado Leonardo DiCaprio, ele buscava um ator de origem germânica. A escolha certeira foi Christoph Waltz, então desconhecido do grande público. Sua performance não apenas roubou a cena, mas também lhe rendeu o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante, consagrando-o como um dos grandes destaques do filme.
A história, inspirada na Operação Greenup da Segunda Guerra Mundial, reimagina eventos históricos com a assinatura estilística de Tarantino. Na operação real, os judeus refugiados Frederick Mayer e Hans Wijnberg, aliados ao ex-tenente alemão Franz Weber, infiltraram-se no território nazista para desestabilizar a logística inimiga. Em “Bastardos Inglórios”, essa trama ganha vida como o grupo liderado pelo tenente Aldo Raine (Brad Pitt), cujo objetivo é caçar e eliminar nazistas, culminando em um plano audacioso para assassinar Hitler. Entre os membros do grupo estão personagens icônicos como o sargento Donny Donowitz (Eli Roth) e o tenente Archie Hicox (Michael Fassbender).
Paralelamente, Shoshana, que agora vive em Paris com uma nova identidade, herda um cinema e planeja sua vingança. Durante a estreia de um filme nazista, ela pretende trancar os convidados — incluindo Hitler — e incendiar o local. Essa convergência entre os planos dos Bastardos e a vingança de Shoshana conduz o filme a um clímax explosivo e inesquecível.
Uma das cenas mais brilhantes ocorre em um pub, onde a tensão atinge níveis insuportáveis. Disfarçados de soldados nazistas, Hicox, Stiglitz e Wicki se encontram com a agente dupla Bridget von Hammersmarck (Diane Kruger) para organizar o ataque. No entanto, a desconfiança do major SS Hellstrom (August Diehl) é despertada por um gesto inocente: ao pedir três copos, Hicox usa os dedos médio, indicador e anelar, um gesto não convencional na cultura alemã. Esse detalhe sutil desencadeia um confronto mortal, exemplificando a habilidade de Tarantino em construir suspense com maestria.
Tarantino combina elementos de comédia, violência estilizada e reviravoltas históricas em um filme que desafia convenções. Em sua versão fictícia da Segunda Guerra Mundial, o diretor não apenas ressignifica eventos históricos, mas também oferece ao público uma catarse emocional e artística. O resultado é uma obra que mistura entretenimento, inteligência e uma visão única sobre o poder do cinema como veículo de reimaginação histórica.
Com diálogos memoráveis, personagens inesquecíveis e uma narrativa cheia de camadas, “Bastardos Inglórios” solidifica a reputação de Tarantino como um dos cineastas mais audaciosos de sua geração. Em sua “revanche” cinematográfica, ele transforma a tragédia em arte, criando um filme que continuará a ser celebrado por décadas.
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