A trama apresenta Tyler Rake como um anti-herói que desafia convenções: nem herói clássico nem vilão declarado, mas alguém que opera nas margens entre sobrevivência e destruição. Chris Hemsworth encarna um mercenário marcado por traumas e vícios, cuja trajetória evidencia as nuances de um homem que se equilibra entre a brutalidade de sua profissão e lampejos de uma humanidade teimosa. Sob a direção de Sam Hargrave, o filme explora um universo sombrio, onde a violência não é apenas uma consequência, mas uma constante, enquanto seu protagonista luta tanto contra inimigos quanto contra si mesmo, em uma espiral que questiona os limites da redenção e do sacrifício.
O roteiro assinado por Joe Russo oferece uma visão crua de um mercenário desajustado, contratado para resgatar o filho de um poderoso chefe do crime indiano. O jovem refém, filho de um gângster preso, está nas mãos de um inimigo implacável, e a missão de Rake rapidamente se transforma em uma sucessão de armadilhas e traições que colocam à prova não apenas suas habilidades, mas também sua resiliência emocional. Por meio de flashbacks fragmentados, a narrativa humaniza o personagem, revelando uma figura instável, atormentada por perdas pessoais e escolhas duvidosas. Ainda assim, Rake é movido por um senso de responsabilidade quase visceral, que ressurge com força quando percebe que sua missão pode ser mais do que um contrato profissional: uma luta por algo maior que ele mesmo.
A operação de resgate é uma sucessão de conflitos que desafiam o planejamento e a lógica, em meio a cenários que alternam entre o caótico e o desolador. O elenco coadjuvante, com Golshifteh Farahani no papel de Nik Khan, adiciona complexidade à trama, ampliando as possibilidades narrativas enquanto destaca a fragilidade das alianças formadas no submundo. Em contraste, David Harbour surge como Gaspar, um aliado ambíguo cuja presença levanta mais perguntas do que respostas, alimentando as tensões de um enredo que se desenrola com brutalidade e surpresa. Ao mesmo tempo, a dinâmica entre Rake e o refém adolescente oferece momentos de vulnerabilidade em meio à carnificina, evidenciando um vínculo que transcende o dever, mesmo que nunca escape das sombras de desconfiança que permeiam cada interação.
O excesso de personagens e subtramas, no entanto, apresenta desafios para o roteiro. Enquanto algumas situações são resolvidas com soluções apressadas ou implausíveis, outras permanecem abertas, criando uma sensação de desordem que pode frustrar quem busca coesão narrativa. Ainda assim, o filme se apoia no carisma de Hemsworth e em sequências de ação frenéticas, que mantêm o espectador preso a cada reviravolta. A visceralidade das cenas, aliada ao humor ácido e à relutância do protagonista em aceitar qualquer forma de heroísmo, trazem uma autenticidade rara ao gênero.
A violência que permeia o longa é retratada sem filtros, celebrando um estilo de ação que dialoga com produções de décadas passadas, onde sangue e brutalidade eram elementos centrais. No entanto, sob essa camada, o filme levanta questões sobre poder, moralidade e desigualdade, desafiando o público a interpretar o papel de Rake em um mundo onde as fronteiras entre certo e errado se dissolvem facilmente. A relação entre o mercenário e o jovem refém é o fio condutor que sustenta a narrativa, oferecendo um contraste entre a brutalidade do ambiente e a esperança de um vínculo genuíno, por mais improvável que pareça.
★★★★★★★★★★