Quantas paixões podem revelar sobre uma pessoa? Talvez mais do que imaginamos. Uma paixão intensa pode ser o catalisador para o amor florescer, mesmo nos terrenos mais áridos. Se verdadeiro, o amor ultrapassa barreiras e inspira gestos duradouros — como cartas em uma era dominada por mensagens efêmeras e sentimentos tão voláteis quanto os tempos modernos.
Em “A Última Carta de Amor”, Augustine Frizzell adapta o best-seller de Jojo Moyes em uma narrativa que faz das correspondências românticas o ponto de partida para uma história que, embora previsível em alguns momentos, é conduzida com refinamento e profundidade emocional. Frizzell captura com sensibilidade o desalento de uma mulher que, ao perder-se de si mesma, encontra na força de um amor proibido a convicção de que sua existência não precisa se limitar ao conformismo melancólico que lhe foi imposto.
Alternando entre passado e presente, o filme constrói um elo entre duas mulheres de épocas distintas. De um lado, Jennifer Stirling, uma socialite dos anos 1960 com um casamento de fachada e um amor secreto que desafia convenções. Do outro, Ellie Haworth, uma jornalista moderna que, ao encontrar uma carta esquecida nos arquivos do jornal onde trabalha, mergulha em um mistério capaz de transformar sua visão de mundo. Essa troca de perspectivas não apenas une essas mulheres como também expõe a complexidade dos anseios amorosos em diferentes tempos.
O roteiro, assinado por Moyes, Esta Spalding e Nick Payne, apresenta uma narrativa dual. Jennifer, interpretada com delicadeza por Shailene Woodley, é uma mulher dividida entre os compromissos sociais de seu casamento com Lawrence (Joe Alwyn) e os sentimentos avassaladores por Anthony O’Hare (Callum Turner), um jornalista estrangeiro. Ellie, vivida por Felicity Jones, tem sua própria jornada: inicialmente relutante ao ser designada para escrever o necrológico de um editor falecido, ela acaba se deparando com uma carta de amor que desperta sua curiosidade e, gradualmente, a conduz por um caminho de autodescoberta.
Frizzell utiliza o artifício da carta como um fio condutor, unindo histórias que, à primeira vista, parecem separadas pelo tempo. Jennifer é uma figura cativante, cuja elegância é realçada pelos figurinos meticulosamente desenhados por Anna Robbins, que evocam a sofisticação de Jacqueline Kennedy. Já Anthony, com sua aura de romantismo e vulnerabilidade, personifica o desejo de Jennifer por uma conexão mais genuína do que a oferecida por seu marido distante.
Embora o núcleo dos anos 1960 explore temas já recorrentes em narrativas sobre amores proibidos e as limitações impostas às mulheres da época, Frizzell mantém o interesse ao investir na dualidade emocional das personagens. Ellie e Rory (Nabhaan Rizwan), o arquivista inicialmente reservado, protagonizam um romance contemporâneo que, embora menos melodramático, é construído com sutileza e autenticidade.
Visualmente, o filme é um espetáculo. A fotografia captura com precisão a aura nostálgica da década de 1960 e o dinamismo do presente, criando um contraste que reflete os estados emocionais das protagonistas. As deficiências narrativas — como a falta de clareza sobre o acidente de Jennifer — são mitigadas pela direção estilizada de Frizzell, que transforma até mesmo as lacunas em um elemento de mistério.
“A Última Carta de Amor” não é apenas sobre amores impossíveis; é uma celebração da persistência dos sentimentos em meio às adversidades. Ao costurar as tramas de Jennifer e Ellie, o filme propõe uma reflexão sobre como o amor, em todas as suas formas, transcende o tempo e deixa marcas indeléveis.
★★★★★★★★★★