Nada como cair na estrada ao lado de amigos para restaurar energias, apaziguar velhos ressentimentos e deixar para trás os fantasmas do passado. Essa é a essência de “Will & Harper”, documentário dirigido por Josh Greenbaum, que acompanha dois companheiros em uma viagem pelo Centro-Oeste dos Estados Unidos. Durante o trajeto, eles reavaliam o significado de sua relação e percebem que, no fundo, a amizade permanece imutável — exceto por uma peça essencial desse quebra-cabeça. Greenbaum conduz a dupla título às profundezas de memórias quase esquecidas, devolvendo a eles a clareza que o tempo havia turvado. Ao longo dos 114 minutos de duração, Will Ferrell e Harper Steele protagonizam cenas repletas de humor, aventuras e melancolia, sempre com uma honestidade cativante que permeia toda a narrativa.
Will Ferrell, veterano do Saturday Night Live, representa uma geração de comediantes cujo brilho, por vezes, passa despercebido em meio à atual paisagem hollywoodiana. Greenbaum utiliza essa espontaneidade para fazer uma crítica à superficialidade da indústria do entretenimento. Ao lado de Ferrell, Harper Steele, que antes da transição de gênero era conhecida como Andrew Steele e roteirista de vários sucessos do ator, traz um olhar aguçado e introspectivo para a jornada. Essa história de estrada ganha profundidade enquanto a dupla faz paradas em restaurantes de beira de estrada, frequentados por Harper em uma outra fase de sua vida.
Josh Greenbaum acompanha os dois com olhar atento, pontuando a narrativa com comentários sutis sobre a realidade política e social dos Estados Unidos. Harper, ainda que ferida por experiências de discriminação, declara seu amor pelo país, embora questione se esse sentimento é recíproco. Um questionamento que, longe de ser trivial, reflete a dura realidade enfrentada por minorias em uma sociedade em constante conflito de identidade.
O documentário se aprofunda nessas discussões, utilizando Harper como uma voz dessas minorias que exigem, de forma justa e cada vez mais ruidosa, seus direitos e reconhecimento. Enquanto isso, Will Ferrell, com seu humor característico e desprovido de filtros, tenta aliviar as tensões. Esse contraste entre os dois é um dos grandes trunfos do filme, lembrando ao público de sucessos anteriores de Ferrell, como “Casa de Mi Padre” (2012) e “O Tigrão” (2000).
Com delicadeza e sinceridade, “Will & Harper” ilustra uma verdade desconfortável: a jornada se torna mais leve quando ignoramos o peso de nossos próprios passos. Melhor ainda se, entre os desafios e as reflexões, houver espaço para um sorriso sincero.
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