O filme mais bonito que você verá este ano: um diamante para os olhos e para a alma Divulgação / Netflix

O filme mais bonito que você verá este ano: um diamante para os olhos e para a alma

Poucos nomes em Hollywood surpreendem tanto quanto Adam Sandler. Por anos, ele foi associado a comédias previsíveis como os dois filmes da franquia “Gente Grande” (2010-2013), dirigidos por Dennis Dugan, ou “Cada Um Tem a Gêmea Que Merece” (2011), que não passou de uma coleção de clichês. Esse padrão também se repetiu em “O Zelador Animal” (2011), de Frank Coraci, onde Sandler parecia preso à repetição de papéis idênticos e roteiros pouco inspirados. Contudo, nos últimos anos, uma mudança significativa tem redefinido sua carreira. Desde “Joias Brutas” (2019), dirigido pelos irmãos Safdie, e “Os Meyerowitz: Família Não Se Escolhe” (2017), uma sátira dirigida por Noah Baumbach, Sandler vem explorando personagens mais densos e sombrios. Surpreendentemente, sua falta de graça nesses papéis é uma virtude inegável.

Essa tendência ganha mais força com “Arremessando Alto” (2022), dirigido por Jeremiah Zagar, e agora se solidifica com “O Astronauta”. Neste filme, Sandler parece finalmente concretizar um desejo antigo de mostrar uma faceta menos óbvia de sua atuação. Sob a direção do sueco Johan Renck, conhecido por trabalhos viscerais como a série da HBO “Chernobyl” (2019), o longa é uma adaptação de “Spaceman of Bohemia” (2017), o romance de ficção científica de Jaroslav Kalfař. Renck conduz a narrativa de maneira a destacar o lado mais melancólico e solitário do protagonista, algo que Sandler interpreta com notável sutileza.

Jakub Prochazka, o personagem de Sandler, é um homem de escolhas louváveis aos olhos do mundo, mas devastadoras para sua vida pessoal. Em uma missão espacial de seis meses entre a Terra e uma região desconhecida do cosmos, ele se depara com a possibilidade de retornar sem a certeza de que alguém ainda o espera. A história expõe a dura realidade de que, para conquistar algo grandioso, é preciso abrir mão de muito — um sacrifício que nem sempre vale a pena.

A busca por sentido em meio ao vazio existencial permeia cada cena. A beleza, muitas vezes, reside onde menos se espera: no ridículo, no trágico ou no desespero. O filme questiona se a serenidade idealizada dos romances convencionais pode oferecer a mesma intensidade que os desafios da vida real. Há uma certa poesia no sofrimento humano, um encanto sombrio que transforma até os fracassos mais patéticos em algo quase sublime.

Heróis enfrentam dilemas que os “simples mortais” jamais compreenderão por completo. No entanto, essa grandeza pode ser corroída pela indolência ou por um cansaço moral que os torna iguais aos outros. Jakub, por sua vez, opta por escapar das complicações terrestres, preferindo a vastidão silenciosa do espaço. Contudo, suas memórias não o deixam em paz. Ele revisita conflitos não resolvidos com o pai, que permanece ausente na narrativa, e o casamento com Lenka, vivida por Carey Mulligan. Sua esposa surge em uma participação discreta, cuja relevância se perde em meio ao isolamento do protagonista, superada apenas pela figura da comissária Tuma, interpretada por Isabella Rossellini.

Curiosamente, o único ser que realmente desperta afeto genuíno em Jakub é Hanus, um gigantesco aracnídeo dublado por Paul Dano. Estranho, sim, mas essencial. Hanus não hesita em lançar verdades desconfortáveis, como quando aponta que a solidão de Jakub é “autoinfligida” e não uma condição inevitável da humanidade.

O roteiro, assinado por Kalfař e Colby Day, entrega diálogos pungentes e reflexivos. Hanus se torna uma espécie de espelho existencial para Jakub, que eventualmente também se despede dessa criatura singular. E, embora Jakub retorne fisicamente ileso à Terra, a dor de reencontrar o que deixou para trás é inescapável. Ser herói no espaço é fácil; enfrentar a complexidade da vida comum é que se revela o verdadeiro desafio.

Filme: O Astronauta
Diretor: Johan Renck
Ano: 2024
Gênero: Aventura/Ficção Científica
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★