Daqueles filmes que você precisa assistir e recomendar: a joia rara da Netflix que vai tocar sua alma Jojo Whilden / Netflix

Daqueles filmes que você precisa assistir e recomendar: a joia rara da Netflix que vai tocar sua alma

“Mais Uma Chance” transcende a simples narrativa de um casal em busca da parentalidade tardia. Ao invés de uma trama clichê, a diretora Tamara Jenkins cria um espelho para a fragilidade humana, onde a perseverança de Rachel (Kathryn Hahn) e Richard (Paul Giamatti) reflete uma batalha interna e social. Eles não são apenas um casal de meia-idade enfrentando os reveses biológicos: ela com 41 anos, ele com 47, ambos prisioneiros de um desejo que se transforma em uma espécie de armadilha emocional.

O tempo se impõe como antagonista silencioso, mas implacável. Rachel enfrenta a infertilidade, enquanto Richard, com um único testículo disfuncional, carrega também o peso da impossibilidade. E à medida que as esperanças se dissipam, a realidade brutal se insinua: o sonho de ter um filho pode estar mascarando lacunas profundas em suas vidas e no relacionamento. A trama, embora particular, ressoa universalmente com qualquer pessoa que já se viu presa entre a persistência e a autoilusião.

O roteiro de Jenkins conduz o espectador por uma montanha-russa emocional, alternando entre o cômico e o trágico com fluidez surpreendente. A peregrinação de Rachel por consultórios médicos é retratada com um humor ácido, especialmente em cenas com o dr. Dordick (Denis O’Hare), cujo realismo pragmático contrasta com o otimismo desesperado do casal. Richard, por sua vez, lida com a frustração de um passado desperdiçado e um presente medíocre — um ex-ator que agora vende picles. Rachel, escritora bloqueada, canaliza sua ansiedade em um desejo quase irracional de maternidade.

A dinâmica com a família de Richard adiciona camadas à narrativa. O irmão Charlie (John Carroll Lynch) e sua esposa Cynthia (Molly Shannon) oferecem apoio emocional e financeiro, mas também refletem as tensões que surgem quando sonhos pessoais se chocam com a dura realidade financeira. A tensão atinge seu auge quando um pedido de empréstimo desencadeia uma explosão de ressentimentos contidos, revelando as feridas ocultas nas relações familiares.

Nessa teia de frustrações e falhas, surge Sadie (Kayli Carter), a jovem sobrinha cuja ingenuidade e esperança contrastam brutalmente com os dilemas existenciais dos tios. Quando Rachel e Richard lhe fazem uma proposta inesperada, os papéis se invertem: os protagonistas deixam de ser heróis românticos e se tornam figuras trágicas, tentando desesperadamente preencher um vazio que talvez nunca possa ser ocupado.

Jenkins captura com maestria a classe média branca contemporânea, atolada em desejos inalcançáveis e incapaz de renunciar às próprias ambições. A diretora não faz julgamentos, mas expõe com crueza o egoísmo e a vaidade dos personagens. Rachel e Richard acreditam que um filho possa ser a solução para todos os seus fracassos, mas o filme sugere que a felicidade talvez esteja em aceitar os limites impostos pela vida.

Com atuações sublimes de Hahn e Giamatti, “Mais Uma Chance” transforma o ordinário em extraordinário. A narrativa desafia o espectador a questionar até onde vale a pena insistir em um sonho e quando é mais digno aceitar a realidade. No fim, o filme nos lembra de uma verdade simples, mas poderosa: cada momento é único e irrepetível. A grandeza está em reconhecer os ciclos da vida e ter a coragem de respeitá-los.

Filme: Mais Uma Chance
Diretor: Tamara Jenkins
Ano: 2018
Gênero: Comédia/Drama
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★