No topo do mundo: o filme mais assistido do momento na Netflix Christopher Raphael / Netflix

No topo do mundo: o filme mais assistido do momento na Netflix

A história de Cristo tem sido exaustivamente adaptada no teatro e no cinema, com interpretações que variam conforme a visão e intenções de seus realizadores. Em “Virgem Maria”, D.J. Caruso adota uma perspectiva singular: em vez de uma figura transcendental e inabalável, ele apresenta uma jovem cujo amadurecimento espiritual se constrói em meio a dilemas e fragilidades humanas.

A tradição religiosa frequentemente idealiza os personagens bíblicos, como se eles estivessem plenamente conscientes de sua missão divina. Contudo, ao aplicar um olhar humanizado, é plausível imaginar que, em meio à opressão romana e às tensões políticas do século I a.C., medo e dúvidas fossem companheiros constantes desses indivíduos.

Na Judéia, dominada por Roma e governada com mão de ferro por Herodes, o Grande, a promessa de um Messias representava uma ameaça real. Anthony Hopkins interpreta Herodes como um líder paranoico e cruel, disposto a eliminar qualquer possibilidade de perda de poder. A cena do massacre dos inocentes é o clímax dessa paranoia. No entanto, a atuação de Hopkins, por mais talentosa que seja, é diluída por aparições excessivas e mal justificadas, parecendo mais um recurso para capitalizar seu nome do que uma contribuição à narrativa.

Em contraste, Noa Cohen oferece uma interpretação comovente de Maria, uma jovem cuja fé é intrínseca desde o nascimento. Sua história é marcada pela esperança de seus pais, que acreditam em uma promessa divina após uma visita angelical. Conforme os anos passam, Maria é confrontada com revelções sobre seu papel nos desígnios de Deus.

Ao seu lado está José, interpretado por Ido Tako. Simples e dedicado, ele se apaixona por Maria e aceita com humildade e coragem os mistérios que a envolvem. A relação dos dois é retratada com doçura, mostrando o crescimento emocional do casal enquanto enfrentam a incompreensão da sociedade e os desafios impostos pela gravidez inesperada.

Os pais de Maria desempenham um papel importante na narrativa, oferecendo apoio emocional quando o casal enfrenta o julgamento implacável da comunidade. Essa rede de suporte é crucial para a sobrevivência do bebê Jesus, ameaçado pela fúria de Herodes. A jornada de Maria e José torna-se um testemunho de sacrifício e resiliência.

Porém, a promessa do filme de humanizar essa história sagrada fica apenas na intenção. A narrativa se perde em um limbo entre a tradição religiosa e a liberdade artística, não conseguindo satisfazer nem os espectadores devotos nem aqueles em busca de um drama histórico envolvente. A falta de coesão enfraquece a obra, deixando-a morna e esquecível.

Apesar de falhar em agregar algo substancial à tradição cinematográfica sobre Cristo, “Virgem Maria” merece crédito pela tentativa de explorar a complexidade emocional dos personagens bíblicos. Ao menos em sua proposta, lembra-nos que por trás dos ícones religiosos existiram pessoas comuns, suscetíveis às mesmas dúvidas e medos que nos afligem hoje. Infelizmente, essa abordagem promissora é desperdiçada por uma execução inconsistente e sem impacto.

No fim, “Virgem Maria” não se destaca nem por sua narrativa nem pelo visual. Sua recepção morna é reflexo de um roteiro que não ousou o suficiente e de escolhas que impediram a obra de deixar uma marca duradoura. A história de Maria merecia mais.

Filme: Virgem Maria
Diretor: D.J. Caruso
Ano: 2024
Gênero: Drama
Avaliaçao: 7/10 1 1
★★★★★★★★★★