Publicado em 1817, “Persuasão” encerra a trilogia de Jane Austen iniciada por “Razão e Sensibilidade” (1811) e seguida por “Orgulho e Preconceito” (1813). Nessas obras, Austen explora o conflito entre o amor e as exigências pragmáticas da vida. No último romance, a autora examina os dilemas de uma família aristocrática em decadência financeira, cuja única esperança de redenção repousa num casamento arranjado, prejudicado pela sombra opressora de uma matriarca vigilante.
Entre o humor mordaz de “Orgulho e Preconceito” e o tom austero de “Persuasão”, encontramos o espirituoso “Emma”. Esta sátira elegante desvenda os caprichos e fragilidades da alta sociedade inglesa do início do século XIX. Enquanto Jane Austen sofria os sintomas debilitantes da doença de Addison — um mal desconhecido à época, que a levaria à morte aos 42 anos, em 18 de julho de 1817 —, ela destilava uma crítica social afiada e irreverente. A adaptação de Douglas McGrath (1958-2022) acentua o tom farsesco desse refinado teatro de dissimulações, onde uma protagonista de fachada angelical manipula o destino alheio até que o jogo se vira contra ela.
Apesar do elenco secundário de excelência, “Emma” é uma vitrine para Gwyneth Paltrow. No papel da senhorita Woodhouse, Paltrow personifica uma jovem que se vê como a soberana informal de Highbury, um bucólico distrito londrino. Sua missão autodeclarada é orquestrar os caminhos românticos dos outros, especialmente os de sua amiga Harriet Smith, uma moça respeitável, porém de origem incerta e já considerada “passada” para os padrões rigorosos da época.
Essa atuação serviu de ensaio para sua consagração em “Shakespeare Apaixonado” (1998), pelo qual Paltrow receberia o Oscar de Melhor Atriz — um triunfo que ainda desperta ressentimento entre os que preferem a força dramática de “Central do Brasil” (1998), de Walter Salles, com Fernanda Montenegro no papel principal.
McGrath, ao adaptar o roteiro, suaviza os conflitos da trama, mas mantém a essência da sátira social de Austen. Ele posiciona Paltrow como a estrela central, mas permite que Toni Collette, como Harriet, brilhe em cena. Neste palco de aparências e cortesia afetada, os personagens medem seu valor por aquilo que aparentam ser. Emma, ao final, aprende sua lição — mas nunca perde a pose. Assim, Jane Austen segue imortal, capturando com maestria a hipocrisia e os encantos de sua época.
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