O clima londrino fazia um bem desgraçado aos meus pulmões. Após concluirmos mais uma enquete com os leitores da Revista Bula, os quais elegeram “As 10 Melhores Canções do Pink Floyd” em todos os tempos, por meio de votação nas redes sociais, o editor chefe me enviou dentro de um baú para o velho continente, a fim de que eu tratasse com fog a minha velha tosse canina, além de ter me incumbido da extasiante missão de visitar um reduto para fãs do Pink Floyd em Londres. Eu já sabia: o rock estava morrendo. Portanto, às novas gerações, aos miseráveis ouvintes que nunca ouviram falar em Pink Floyd, informo que esta foi uma das melhores bandas de rock que já tocaram no planeta e, acreditem, até mesmo no “The dark side of the moon”.
Se tinha ou se não tinha lua no céu, eu jamais saberei. Eu claudicava sozinho até o “Pigs”. Eu supunha, eu nutria “High hopes” de que aquela experiência seria uma espécie de “The division bell” para mim. Eu esperava levar uma vida diferente, melhor, concluída aquela saga por plagas inglesas. Com alguma sorte, por exemplo, conseguiria também passagens de ida e volta para Liverpool, a fim de chorar de emoção dentro do Cavern Club, berço musical dos Beatles, a minha banda predileta.
Enquanto eu marchava solitário, a densa neblina cobria tudo. Olhei para o alto. Nada de “Time”. Nada do Big Ben. Nada lembrava “Summer 68”. Senti saudades do céu azul da minha terra: “Goodbye, blue sky”. A névoa fresca penetrava as minhas narinas, fazendo cócegas no cérebro. Eu ria de qualquer pensamento idiota que me invadisse a mente só para me manter aquecido e vivo. Quando cheguei ao pub, um porteiro grandalhão e mal humorado, que se parecia pra cacete com o baixista Roger Waters, disse “Hey you! Você não pode entrar. Casa lotada”. Eu disse ao porteiro veado que eu era o enviado especial da famosa Revista Bula, do Brasil. Então, as portas se abriram para mim, não sem que antes eu deixasse um bocado de “Money” e passasse pelos focinhos gelados de dois “Dogs”.
Assim que percorri o corredor de entrada, me deparei com um velhota seminua, voluptuosa à beça, que rebolava dentro de uma gaiola dourada, dando tudo de si, ao som de “Another brick in the wall”. Desde um involuntário tesão de urina que sofrera pela manhã, tive a minha primeira ereção em solo britânico. Senti que estava no lugar certo, na hora certa. Gritei para ela: “Shine on, you crazy diamond!” Ela sorriu. Deve ter lido os meus lábios, já que havia muita zoeira no local. Valendo-me de um inglês macarrônico, perguntei ao barman, um sujeito que era a cara do Syd Barrett no auge do seu vício em punheta, antes de ser afetado por um irreversível “Brain damage”, como era possível que uma senhora, àquela altura da vida, perdesse a vida chacoalhando nacos de carne amanteigada dentro de uma gaiola de boate. O sujeito explicou que a fogosa dançarina era uma imigrante brasileira ilegal chamada dona Maria. Ela teria dito ao proprietário daquele estabelecimento que pretendia trabalhar até morrer ou até ficar louca. O que rolasse primeiro ela topava. Coisas da Reforma Previdenciária no Brasil, se é que me entendem. Brasileiro aguentava bucha. Então, foi contratada como bailarina da melhor idade. O rock até podia ser progressivo, mas, eu percebi um certo retrocesso naquilo tudo.
Pra não perder o costume, pra não deixar baixar o nível alcoólico na corrente sanguínea, pedi ao sósia do Syd Barrett uma dose dupla de Cuspe com gelo e limão. Perguntei se era permitido fumar um dos meus “Jeronimo’s” ali dentro. Ele disse que sim, que não apenas era permitido, como era estimulado. Então, meteu a mão no meu bolso, filou um cigarro e o acendeu na boca de um cuspidor de chamas que divertia o público, um sujeito baixinho que me lembrou o baterista Nick Mason no auge da fama. Passei a me sentir cada vez mais “Comfortably numb” dentro do “Pigs”.
O reduto era escuro, enfumaçado, com cheiro de carpete molhado, deplorável na medida certa, totalmente rock and roll, ou seja, démodé. Em matéria de decoração despojada, havia de um tudo dependurado nas paredes e no teto do pub: pôsteres dos Pink Floyd, em todas as suas fases e formações; guitarras usadas pelo próprio David Gilmour, um porco inflável e um pote de prata com as cinzas do tecladista Richard Wrigth. Num canto, próximo ao palco, sobre um piano branco, velho e desgastado, tinham colocado um moedor de carnes enorme e uma placa com os seguintes dizeres: “Wish you were here”.
Ah, eu quase ia me esquecendo. Seguem abaixo “As 10 Melhores Canções do Pink Floyd”, de acordo com os leitores da Revista Bula. “Breathe” e apreciem.