Talvez a grande pretensão de “Bagagem de Risco” seja querer rivalizar com “Missão Impossível” (1996-2023), começando pelo nome de seu aflito protagonista. Em vários momentos, Ethan Kopek lembra seu xará, sem, contudo, ter o carisma e o jogo de cintura de Ethan Hunt, qualidades fundamentais num enredo que deveria inspirar no público a sensação de que o mundo às vezes lembra uma avenida, larga e imensa, perdida no sem fim da cidade, ao longo da qual nos embrenhamos a horas mortas de uma madrugada deserta, ou, para ficar num campo semântico mais oportuno, um avião voando com o auxílio de instrumentos num céu de tormenta.
Se Ethan Hunt, o anti-herói mais longevo do cinema, já atravessa quase três décadas escalando pedreiras, atirando-se de pontes, aprendendo a pilotar helicópteros na prática e, o mais importante, segurando produções cujo orçamento bate a casa da centena de milhões de dólares, em histórias que se prolongam para mais que as duas horas protocolares do mercado cinematográfico — e não raro seguem reverberando na cabeça do espectador por semanas a fio —, o personagem central do filme de Jaume Collet-Serra dá a impressão de que vai desmaiar de uma hora para a outra, fulminado pela pressão de ter de lidar com uma circunstância tão insólita quanto arriscada.
Narrativas de ação têm por fundamento dispor de uma natureza pronunciadamente ambígua. Se por um lado essas histórias, repletas de confrontos diretos, perseguições que não raro extenuam o espectador, tiroteios que, por muito pouco, não massacram o pobre candidato a salvador da humanidade, também encerram lições sobre como fomos abrindo mão do prazer diário que a vida deveria ser e passamos a nos conformar com a angústia. Kopek é um agente em fase de treinamento da TSA, o órgão que faz a segurança dos sistemas de transporte nos Estados Unidos, e esta decerto fora a razão pela qual torna-se o alvo perfeito de um viajante misterioso que o persegue, o chantageia e faz com que termine por autorizar o embarque de um pacote suspeito na véspera de Natal.
Os roteiristas T.J. Fixman e Michael Green elencam situações corriqueiras num aeroporto durante um feriado naturalmente caótico como se fossem o próprio apocalipse, e malgrado os talentosos Taron Egerton e Jason Bateman sejam hábeis em driblar as lacunas do texto, as duas horas de duração são prazerosas como uma criança mimada que quer o nosso assento.
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