O amor, assim como uma tempestade em alto-mar, transforma o familiar em algo desconhecido. Esse encontro avassalador gera uma fusão onde limites se dissipam e, por vezes, o desequilíbrio emocional se instala. É a receita perfeita para narrativas que tocam o coração e fazem os olhos se encherem d’água.
Em “Por Lugares Incríveis” (2020), o que parece ser uma jornada por paisagens grandiosas rapidamente se torna uma exploração das complexidades da alma. Ambientado no discreto interior de Indiana, o filme surpreende ao extrair beleza de cenários cotidianos e emocionais. A trama, inspirada no livro homônimo de Jennifer Niven e adaptada por ela em parceria com Liz Hannah, é conduzida com sensibilidade por Brett Haley. Conhecido por driblar clichês com maestria, o diretor transforma paisagens comuns em cenários de paixão e descoberta.
Elle Fanning e Justice Smith dão vida a Violet e Finch, dois adolescentes feridos por tragédias pessoais. Eles não são astros de beleza impecável ou carisma inquestionável, mas é justamente essa simplicidade que os torna magnéticos. Separados, são vulneráveis; juntos, são quase invencíveis. Fanning interpreta Violet, uma garota presa ao trauma de um acidente que levou sua irmã. Smith é Finch, um jovem cuja dor silenciosa se torna palpável. Quando os caminhos dos dois se cruzam, a promessa de um recomeço surge entre os destroços de suas vidas.
As atuações são fortalecidas por coadjuvantes precisos, como Alexandra Shipp, que traz um contraponto essencial ao drama, e Keegan-Michael Key, que adiciona profundidade como o mentor pedagógico Embry. Em nenhum momento o filme se permite cair em fórmulas fáceis. Mesmo com o pano de fundo racial e social, “Por Lugares Incríveis” evita esterétipos, focando no que há de universal na experiência do sofrimento e da superação.
Os diálogos — ágeis, irônicos e permeados por referências literárias — revelam mais do que a superfície das palavras. As trocas entre Violet e Finch criam um vínculo onde a dor se dissolve em cumplicidade. O diretor de fotografia, Rob Givens, amplifica essa jornada emocional, transformando o interior de Indiana em um mosaico de cores, sombras e horizontes abertos. As estradas que serpenteiam por vilarejos esquecidos, os campos dourados ao entardecer, e estações de trem adormecidas são um convite à introspecção e às novas possibilidades.
Como todo drama adolescente que se preza, o filme sussurra verdades incômodas e universais: a redenção raramente é indolor. Violet e Finch se encontram, se salvam, e depois se perdem em um ciclo tão belo quanto cruel. Para os que já encararam golpes semelhantes da vida, é um espelho incômodo, mas necessário. O desfecho é uma cicatriz, um lembrete de que algumas dores nunca desaparecem completamente.
“Por Lugares Incríveis” não é apenas uma história de amor juvenil. É uma reflexão sobre o quanto realmente conhecemos os outros e, acima de tudo, a nós mesmos. Brett Haley nos desafia a observar o que há sob a superfície: as pequenas fissuras, os impulsos irrequietos e as possibilidades infinitas de cura e destruição. Neste universo de paisagens discretas e emoções tumultuadas, descobrimos que os lugares mais incríveis são aqueles onde a coragem de enfrentar a própria dor se faz presente.
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