Usar a ficção científica para falar de infâncias fraturadas, casamentos desfeitos, mortes prematuras e toda a sorte de distúrbios sociais não é exatamente uma ideia nova ou original, mas funciona. Quatro anos antes de “Kin”, os gêmeos Jonathan e Josh Baker já sabiam disso e com o curta “Bag Man” (2014) conseguiram unir efeitos visuais irretocáveis e poesia numa história sobre frustrações, autoconhecimento e triunfo moral, protagonizada por um menino de doze anos. “Kin”, o desdobramento de “Bag Man”, mantém tal essência em cada lance do roteiro dos Baker e Daniel Casey, atingindo resultados que contornam o óbvio, mormente depois do segundo ato, quando o filme elabora teses acerca da fibra moral do protagonista, sempre a postos para defender os seus, ainda que eles não mereçam.
Aos catorze anos, Elijah Solinski, um garoto afro-americano de Detroit, lida com o azedume da vida como sua imaturidade recomenda. Adotado por uma família branca cujo pai, Hal, enfrenta uma crise existencial desencadeada com a morte da esposa e a prisão do filho biológico, Jimmy, Eli faz algum dinheiro invadindo prédios em ruínas para furtar fios de cobre e vigas de aço, até que se depara com uma cena dantesca. Um exército de soldados futuristas resta caído pelo chão, e com eles uma arma de alta tecnologia que, como se vai assistir, só responde ao seu toque. Os diretores deixam o público com o gosto do suspense na boca enquanto levam o enredo de volta para a casa dos Solinski, onde Hal prepara o infausto jantar de boas-vindas para Jimmy, que acaba de sair da cadeia depois de sete anos. A certa altura, Jimmy, o personagem de Jack Reynor, menciona que esta é a primeira vez que vê Hal em todo esse tempo, à exceção de uma breve visita para comunicar o passamento da mãe, e nesse lance de inusitado drama os Baker explicam muito do que vem a seguir, quando os embates entre o primogênito e o personagem de Dennis Quaid, num desempenho surpreendente, chegam a um ponto trágico, sem qualquer margem de retorno.
A narrativa volta para sua aura eminentemente criminal com a perseguição de Jimmy por Taylor Balik, um gângster a quem o ex-presidiário deve sessenta mil dólares pela “proteção” dos tempos de xadrez, e então Myles Truitt toma conta do que falta para acontecer até o desfecho. Eli é o único capaz de amparar Jimmy, caçado até Iowa, valendo-se da tal escopeta hi-tech que surrupiara na introdução. “Kin” equilibra-se entre as ótimas passagens em que Truitt catalisa a aura de um verdadeiro super-herói juvenil de Eli, as intervenções afinadas de Reynor e James Franco na pele de mais um bandido dotado de patológica autoconfiança. Na verdade, Eli sempre fora um garoto superpoderoso. A arma era só um pormenor quase dispensável.
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