Com Anthony Hopkins e Anne Hathaway, filme que recebeu 7 minutos de aplausos em Cannes está no Prime Video Divulgação / Focus Features

Com Anthony Hopkins e Anne Hathaway, filme que recebeu 7 minutos de aplausos em Cannes está no Prime Video

“Armageddon Time” de James Gray é uma reflexão cinematográfica pungente sobre os anos 1980 nos Estados Unidos, retratando a complexidade das desigualdades sociais e raciais sob o véu de uma narrativa intimista. Filmado em plena pandemia de Covid-19, o projeto trouxe desafios adicionais, levando Gray a optar pelo formato digital, uma decisão pragmática em tempos de restrições financeiras. No entanto, a parceria com o aclamado diretor de fotografia Darius Khondji manteve intacta a autenticidade visual do período, com o uso de lentes da década de 1970, garantindo uma estética nostálgica e profundamente imersiva.

O título do filme, inspirado na canção homônima da banda The Clash, antecipa o clima de incerteza e transformação que permeia a trama. Ambientada em Nova York, a história se desenvolve em meio ao fervor da campanha presidencial de Ronald Reagan, cujo discurso de renovação e a ameaça constante da Guerra Fria servem como pano de fundo para a vida de Paul Graff (Banks Repeta). Judeu, de classe média e membro de uma família amorosa, Paul vive os dilemas típicos da adolescência: insubordinação, dificuldades acadêmicas e a busca por aceitação.

A trama ganha intensidade com a amizade entre Paul e Johnny Davis (Jaylin Webb), um colega afro-americano cuja realidade contrasta severamente com a dele. Johnny, criado pela avó em condições precárias, vive sob a sombra do sistema de adoção, enfrentando desconfiança constante e punições desproporcionais. Enquanto Paul é protegido pelo status de sua mãe, Esther (Anne Hathaway), uma respeitada figura na comunidade escolar, Johnny é frequentemente julgado por sua aparência e contexto social, mesmo quando inocente.

A transferência de Paul para uma escola particular de elite acentua essas desigualdades. Imerso em um ambiente homogêneo e elitista, ele é confrontado com sua posição de privilégio, desfrutando de oportunidades que Johnny jamais poderia sonhar. O contraste entre os destinos dos dois amigos expõe a brutalidade de uma sociedade onde o ponto de partida define o percurso.

A morte de Aaron Rabinowitz (Anthony Hopkins), avô de Paul e sua bússola moral, marca uma reviravolta emocional. Aaron, com seu carisma e princípios éticos, moldava a visão de mundo de Paul, ensinando-o a valorizar a empatia e a justiça. Sua ausência desestabiliza a família: Esther mergulha na depressão, enquanto Irving (Jeremy Strong), o pai autoritário, assume um papel mais severo. Sem o apoio do avô, Paul se vê dividido entre os privilégios herdados e a consciência emergente das injustiças ao seu redor.

No auge da narrativa, Paul e Johnny encontram conforto em seus sonhos: Paul deseja ser artista, enquanto Johnny sonha em ser astronauta. Ambos planejam fugir para Orlando, uma tentativa desesperada de escapar das limitações de Nova York e buscar um futuro onde possam ser livres para realizar seus desejos.

Gray vai além de uma história de amizade, tecendo uma crítica profunda às divisões estruturais nos EUA. O filme explora como o contexto sociopolítico influencia trajetórias individuais, destacando o peso do privilégio na determinação das oportunidades. A relação de Paul e Johnny simboliza a luta pela justiça intergeracional, expondo a necessidade urgente de encarar essas disparidades.

“Armageddon Time” não é apenas uma narrativa pessoal; é uma análise contundente das promessas vazias do “sonho americano”. A amizade entre Paul e Johnny serve como um espelho das desigualdades enraizadas, sugerindo que mérito e esforço, isoladamente, não são suficientes para transcender barreiras sociais. A obra é um convite poderoso à introspecção sobre empatia, justiça e o papel das escolhas individuais na construção de uma sociedade mais equitativa.

Filme: Armageddon Time
Diretor: James Gray
Ano: 2022
Gênero: Biografia/Drama
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★