“Operação Fronteira” reúne um quinteto de personagens que abandonam qualquer pretensão de integridade moral para garantir uma vida mais digna às suas famílias, lançando-se em uma espiral de ações aviltantes. Como ocorre em muitos filmes de ação, os protagonistas enfrentam dilemas éticos extremos, mas aqui, a abordagem de J.C. Chandor, que coescreveu o roteiro com Mark Boal — premiado pelo Oscar por “Guerra ao Terror” (2008), de Kathryn Bigelow —, diferencia-se por sua sofisticação narrativa. Chandor constrói uma trama que vai além da mera exploração da violência ou da sobrevivência: ele convida o espectador a refletir sobre a ambivalência moral de seus personagens, transformando a corrosão ética em um elemento central. Embora essa deformidade não redima os protagonistas, ela os aproxima perigosamente da redenção.
O filme explora um território saturado de convenções narrativas e, ainda assim, consegue subvertê-las com elegância. Em um cenário repleto de confrontos, reviravoltas e uma constante tensão entre vida e morte, o diretor rejeita a dicotomia tradicional entre o herói virtuoso e o vilão disforme. Chandor propõe uma visão mais complexa: seus personagens são falíveis e humanos, presos entre o desejo de sobrevivência e a ruína ética. Este olhar se conecta à filmografia do diretor, que já em “Até o Fim” (2013) investigava os limites da resiliência humana. Em “Operação Fronteira”, a narrativa se alonga por mais de duas horas, período em que as noções de certo e errado não apenas se chocam, mas se fundem, gerando um desconforto inquietante.
A “fronteira” do título não se limita à geografia que une Brasil, Argentina e Paraguai, no curso sinuoso do rio Paraná. É também uma metáfora para os limites — ou a ausência deles — que esses homens cruzam em sua busca desenfreada por dinheiro. Santiago García, apelidado de Papa, é o elo que conecta os eventos. Interpretado por Oscar Isaac em uma performance marcante, García é um ex-integrante da Força Delta, agora radicado na Colômbia, onde lucra em empreitadas militares e mantém estreitas relações com uma elite corrupta. Com uma rede de contatos que lhe garante informações privilegiadas, García está sempre um passo à frente das autoridades no tráfico de drogas.
Yovanna, vivida por Adria Arjona, aparece brevemente na narrativa para revelar a existência de 75 milhões de dólares em dinheiro escondidos na selva por um barão do narcotráfico. Este tesouro desperta em García o desejo de reunir uma equipe tão capacitada quanto implacável. Assim, ele reativa laços com antigos colegas: Tom Davis, o Redfly; os irmãos William (Ironhead) e Ben Miller; e Francisco Morales, o Catfish, interpretado por Pedro Pascal. Cada um desempenha um papel fundamental na missão, ainda que suas consciências sejam relegadas ao segundo plano. Chandor usa essa dinâmica para explorar o verdadeiro cerne de sua história: como a busca pela sobrevivência e pelo lucro testa e destrói os vínculos humanos.
A jornada do grupo pelo interior da América do Sul, marcada por cenários desoladores e desafios inesperados, é tanto física quanto simbólica. Mais do que um embate contra inimigos externos, os protagonistas enfrentam seus próprios limites emocionais e éticos. A ganância que os move, levada ao extremo, transforma a missão em uma tragédia. A brutalidade dos eventos culmina em um desfecho sombrio, onde o preço pago por suas escolhas se revela alto demais, especialmente para um deles. A cena final, desprovida de retórica ou reviravoltas redentoras, sintetiza a mensagem essencial do filme: o dinheiro pode comprar quase tudo, menos o que realmente importa.
Chandor estrutura sua narrativa com precisão, manipulando as expectativas do público ao rejeitar clichês e oferecer uma visão perturbadoramente realista. Com “Operação Fronteira”, ele reafirma seu lugar como um contador de histórias que sabe transformar até os temas mais desgastados em reflexões profundas sobre a condição humana. Este é um filme que desafia e inquieta, deixando no espectador um eco duradouro sobre os limites éticos que estamos dispostos a atravessar.
★★★★★★★★★★