Filmes de ficção científica possuem um magnetismo único: nos desafiam a reconsiderar nossa existência, a refletir sobre o futuro incerto do planeta e a aceitar que somos, como diria Carl Sagan, meras partículas de poeira cósmica em um vasto e insondável universo. A sensação de estar à beira do caos iminente e o temor do imprevisível tornam esse gênero tão cativante. Em um piscar de olhos, tudo pode desmoronar, e a única certeza que nos resta é o agora. Toda a nossa evolução científica e tecnológica pode se transformar em ruínas ou desaparecer junto conosco, deixando apenas a evidência cruel de nossa insignificância. Talvez, no fundo, a ficção científica nos faça confrontar essa soberba humana: um lembrete de que, apesar de nossas conquistas, somos pequenos diante da imensidão cósmica.
George Clooney conduz “O Céu da Meia-Noite” não só como diretor e produtor, mas também como a alma da trama ao interpretar Augustine, um cientista isolado em uma estação no Ártico, enquanto uma catástrofe global ameaça extinguir a humanidade. Na solidão gelada, Augustine se depara com uma descoberta inesperada: uma criança foi esquecida no complexo. Juntos, encontram consolo em meio ao desespero, enquanto ele revive, através de flashbacks, os erros de um passado marcado pelo abandono da família em nome da ciência.
Paralelamente, uma nave com cientistas retorna à Terra após uma missão de exploração em busca de um novo lar. A bordo está Sully (Felicity Jones), uma astronauta grávida, e a comunicação entre a tripulação e Augustine se torna crucial. No entanto, eles precisam lidar com uma verdade devastadora: não há mais um lar para onde voltar. A nave, agora à deriva, transporta profissionais ansiosos por respostas e consumidos pela saudade, agravada pela ausência de conexão com suas famílias.
Baseado no livro homônimo de Lily Brooks-Dalton e adaptado por Mark L. Smith, roteirista de “O Regresso”, “O Céu da Meia-Noite” carrega um peso ainda maior devido às circunstâncias de sua produção, atravessada pela pandemia de Covid-19. As filmagens ocorreram enquanto o mundo vivia isolado, espelhando na ficção o impacto da perda de contato humano. O filme, originalmente planejado para os cinemas, acabou estreando na Netflix, refletindo a transformação do cenário cinematográfico durante a crise global. Para Clooney, este projeto também marcou seu retorno após quatro anos afastado das telas, desde “Jogo do Dinheiro” (2016), e sua conexão com o personagem foi imediata.
Como tantos exemplares do gênero, “O Céu da Meia-Noite” se destaca pela sobriedade: diálogos esparsos e narrativa guiada pelas imagens, deixando a interpretação nas mãos do público. As questões ficam no ar: a menina que acompanha Augustine é real ou uma manifestação de sua culpa? Toda a humanidade foi erradicada? Sully e Adewole (David Oyelowo), ao esperarem um filho, estariam destinados a ser os novos Adão e Eva em K-23? O longa se abstém de oferecer respostas definitivas, confiando na imaginação do espectador para preencher as lacunas.
Essa ausência de respostas é o que perpetua o impacto de “O Céu da Meia-Noite”: um convite à introspecção em tempos de incerteza, evocando nossa humanidade ao mesmo tempo que desafia nossa concepção de futuro.
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