Há quem desafie os limites do impossível em nome do amor, aventurando-se até mesmo pelos domínios dos mortos. Assim é a história de Orfeu, filho de Apolo e da musa Calíope, que desceu ao Hades para resgatar Eurídice, sua amada perdida após a fatal picada de uma serpente enquanto fugia do perseguidor Aristeu. Esse mito grego, imortalizado na ópera “Orfeu e Eurídice” do compositor alemão Christoph Willibald Gluck, lançada na Itália em 1762, encontra ecos inesperados — ainda que distantes em sofisticação — na narrativa contemporânea de “O Amor Mandou Mensagem”, dirigido por James C. Strouse.
Embora Strouse não rivalize com o gênio de Gluck e seu filme esteja longe da profundidade da ópera clássica, ele atinge o propósito que se impõe: explorar a dor de um amor perdido e a possibilidade de renovação, tudo mediado por uma tecnologia que só o século XXI poderia oferecer. Sob uma ótica moderna e cuidadosamente planejada, a trama costura um romance emergente entre momentos de melancolia e artimanhas digitais, fruto da colaboração entre o diretor e suas corroteiristas, Sofie Cramer e Andrea Willson.
A protagonista, Mira Ray, é uma talentosa ilustradora de livros infantis que, como nos contos mais trágicos, vê o amor da sua vida, John, ser abruptamente tirado dela em um acidente banal — atropelado ao sair de um café após um encontro. Incapaz de superar a perda, Mira prolonga um luto que desafia a lógica, até que sua irmã, Suzy (interpretada por Sofia Barclay), lhe sugere uma espécie de terapia peculiar: enviar mensagens ao antigo número de John, presumidamente desativado. No entanto, o destino intervém quando o número é realocado para o celular corporativo de Rob Burns, um crítico musical que pouco entende sobre o universo colorido e imaginativo das ilustrações infantis. Interpretado por Sam Heughan, Rob acaba cruzando o caminho de Mira, formando o ponto de partida para uma nova e inesperada conexão.
Inspirando-se em filmes como “P.S. Eu Te Amo” (2007), Strouse constrói sua narrativa sobre as interações de Priyanka Chopra Jonas e Sam Heughan, cuja química é o pilar mais sólido do longa. Heughan equilibra perfeitamente a resistência inicial de seu personagem com a gradual determinação de conquistar Mira, enquanto Chopra Jonas confere à protagonista uma vulnerabilidade que torna seu luto e sua jornada emocional palpáveis. Contudo, o filme tropeça ao introduzir elementos que desviam a atenção da força central da história, como as aparições pouco funcionais de Céline Dion e Nick Jonas. Enquanto isso, atores coadjuvantes promissores, como Russell Tovey e Celia Imrie, acabam subutilizados, limitando o impacto que poderiam ter oferecido à trama.
No final, “O Amor Mandou Mensagem” consegue, ainda que de maneira modesta, oferecer um reflexo dos desafios do luto e da reconstrução emocional em tempos dominados pela tecnologia. Apesar de não alcançar a profundidade narrativa que a premissa sugere, o filme cumpre o papel de emocionar e entreter, destacando-se pela delicada abordagem dos laços que nos permitem seguir em frente, mesmo diante da perda mais devastadora.
★★★★★★★★★★